“Apartamento Vinte e um”
“Apartamento Vinte e um”
(Thaís Falleiros)
O apartamento era o vinte e um.
A cidade era grande.
O sonho de fazer faculdade gigante.
Sua companheira da nova morada, Juliana.
Não era uma república e sim um apartamento de família.
E Juliana logo se tornaria sua única irmã.
Tudo era novo para a menina.
O emprego, a faculdade, os colegas, a rotina.
E aos poucos a menina foi se sentindo cansada, foi se esgotando as energias.
Que felizmente eram sempre recarregadas todas as noites e dias.
Com as longas conversas, sorrisos, risos e gargalhas que as duas davam ao falar sobre diversos assuntos da vida.
E a amizade crescia como tinha que ser.
E o carinho aumentava a cada amanhecer.
E os motivos para rir eram constantes.
Na hora de dormir, de lavar louça, fazer almoço, ouvir música, assistir tevê.
Elas compartilhavam os dias como quem compartilha o pão nosso de cada dia.
Cada sonho, cada novidade da faculdade.
Eram muitos os motivos para ter alegria.
Mas a menina não esperava o que estava por acontecer.
As infindáveis novidades, a saudade da família, as dificuldades no trabalho e na faculdade, correria no dia-a-dia.
Ônibus logo no raiar do sol, ônibus no fim do expediente, estágio cansativo.
Falta de dinheiro e de tempo.
A Canseira aumentava e a solidão também.
O “Apê” vinte e um, sempre tão alegre deu espaço à “deprê”.
A falta de tempo e a canseira eram tantas e tão mentais quanto físicas, que não sobrava mais tempo para existir a companhia.
A menina não se sentia mais em casa.
Seu quarto era seu único refúgio.
Os livros sua única companhia, e não mais Juliana.
Isso deveria ser apenas uma fase em que a menina acabava de perceber a nova realidade.
Mas a pressão era tanta que num ato de desespero, numa noite chuvosa de dezembro a menina pegou sua mala e se foi.
Era de sua vontade voltar para o colo da mãe.
Ser adolescente novamente e não ter que lavar mais louça, nem tão pouco fazer almoço, pegar ônibus, aguentar a pressão da faculdade e a maldita saudade que sentia da antiga vida.
E assim o apartamento vinte e um ficou vazio naquela noite.
E a linda amizade junto com a mala da menina se foi.
Todas as histórias, risos, sorrisos e gargalhadas ficaram entalados num coração triste.
A menina não tinha culpa.
Ela não sabia falar sobre as dores do coração.
Era tanta pressão, tanta solidão, tanta saudade, e confesso, desilusão com a faculdade que a menina não sabia dizer a verdade.
Nem sabia ao certo o que sentia.
Não sabia nem por onde começar a se explicar.
E foi então que por uma briga boba, dessas que duas irmãs uma hora ou outra tem, que o balão da emoção estourou.
A menina não aguentou.
O carinho era grande, e o misto de sentimentos maior ainda, que não quis brigar, falar, resmungar.
E foi aí que o apartamento sozinho ficou.
Ao chegar em casa, na segunda-feira de manhã, Juliana não encontrou nada.
A menina escreveu três cartas, mas todas haviam sido rasgadas.
O “apê” vinte e um ficou na lembrança.
E a saudade estancada no peito da menina, que depois de tantas risadas, risos, sorrisos e gargalhas, saiu pela porta sem olhar para trás e sem dizer nenhuma palavra.
16-02-2013