estátua
Brincar de estátua, imóvel sobre um fio de lua, não sentir do arame as farpas derramadas pelas ruas, desejam minhas fissuras... Como se possível fosse calar todas as vozes, todas as mãos... Não e não. Não calam-se. Ouço nos passos abaixo de meus olhos navalhas cerrando em uníssono o vil equilíbrio de um corpo vivo, o meu. Esse que ainda insiste nos vãos dos dedos, um sorriso.
E te sinto em meus poros, imóvel, teus tentáculos por mim refestelam-se, sem que de mim tenham meu toque, meu chamado, a posse... Tão longe moram teus ais, tão perto sinto teu hálito a me culpar por tuas desgraças... E nada faço, espero pelo próximo golpe, pelo teu próximo gole de revanche... Sem nexo, nada tem nexo. Um pouco mais e mais desenham teus desejos minha fome.
Respiro fundo, recolho minhas asas, como um pássaro em noites frias, enclausuro-me em meio às minhas penas, aos meus drenos. Imóvel, espero, mais uma vez um milagre dos sóis que amanhecem e anoitecem sem que de mim tomem presença em suas réstias, são cinzas as segundas, as terças, as quartas, as quintas, as sextas, debocham-me os sóis aos sábados e cospem minhas rezas no domingo.
Teu gosto, meu desgosto. Tua sina, minhas mãos sem escolhas, sem linhas... Tua desculpa, minha culpa. Teus atos, meus cacos. Estátua, não respiro, não enxergo, não ouço, sinto e sinto... E peço tornar-me pra você um dia, invisível.