Diante do espelho

Encarou-me aquela figura desmembrada

Com um suave toque de ironia controlada

Nem imaginava ainda eu

O quanto a odiava.

Sem querer estendi a mão

Como se para ver se era real

Nada havia além da ilusão

O espelho se estilhaçou

Um presságio muito mau.

Nos estilhaços cortantes me vislumbrei

Novamente a imagem me encarou

Tão diferente dessa vez

Meu mundo desabou.

Eu era o reflexo

E isso me assustou

Claro, tudo isso tinha nexo

Naquele momento desconexo

A verdade se revelou.

E agora chega de poesia,

Minha sensação se tornou um fato.

Faço de conta de que não sou eu

E de repúdio escondo-me em devaneios

E de solidão me abasteço de mais medos.

Faço de conta de que não sou eu

Aquela imagem refletida.

Pode o mundo ter me transformado

Em garras e ferrões acabrunhados?

Pode o mundo ter me dado

Tudo o que desejei quando descobri o ódio?

Fragmentos de uma alma estuprada

Pelos próprios erros

E arrependimentos

E lamentos.

Resquícios do assassinato da bondade

Do coração latente que só sente

Não bate

Amortece.

Se me perguntam no que foi que eu errei

A imagem no espelho volta à tona

E seu dono vai à farra

Numa sufocante dança de rivalidade

Num macabro rito de crueldade

Os pedaços são colados com sangue seco

Costurados pelo desespero

Cicatrizados pela suficiência

Ocultos pela necessidade de vazio

E de normalidade falsa

Repugnante.

É dualidade que se desfaz em certeza

De dois não tem nada.

No espelho ou fora dele

A vista é a mesma.

Quem sabe o problema seja o espelho

E na superfície lisa de um lago

Outra imagem se revele.

Will Stella
Enviado por Will Stella em 23/11/2012
Reeditado em 23/11/2012
Código do texto: T4001632
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