Meu relógio agora só marca horas trópegas, dessas que não servem para muita coisa.
Parece seguir um ritmo invertido, um compasso novo. De vez em quando, pula dias inteiros. Vai engolindo o tempo de sentir saudades, vai suprimindo o tempo de sorrir de novo.
Meu relógio agora marca-passo pela vida num torvelinho indefinido de horas boas, horas ruins, como se fossem a mesma coisa. Trabalha dia sim, dia não, fazendo da vida um hiato, um travessão.
É um relógio de cortar as vida ao meio, cortar o amor em tiras, cortar os braços em pedaços, de dar beijos apressados, de ter os passos em fuga.
Em seus resquícios de memória, de vez quando reconhece um tempo onde haviam horas suficientes... Um tempo de dias longos, onde sobravam horas no balanço da cortina antiga...
Em seus resquícios de memória, de vez em quando reconhece um tempo onde o amor se prolongava noite a dentro sem nenhum motivo.
Hoje, ele neurotiza a vida e suas horas perdidas choram.
Para acabar com isto, decidi arrastar este tempo esquálido de agora, porta afora.
Mas... Todos os dias, ele volta.

                                                                          [ prosa poética escrita em 2007]