Garoa paulistana

Véu d'agua,

atravesso-te na certeza

de meus propósitos.

No tom vaporoso que conferes à cidade

de maldade e cegueira dos olhos.

Não nego se algum dia esbravejei,

se algum dia não quis que tuas gotas

se misturassem ao meu suor,

nem que minhas lágrimas vertessem,

encachoeirando-se, ganhando forças

junto ao teu nobre e úmido exército.

Na tua presença iluminada,

caminho entre vielas, ruas e alamedas.

Viajo por estradas infinitas

com os pés por entre as poças,

vejo o sorriso das roças,

da gente agreste de fé.

Tú que surges das promessas,

que vem como milagre,

transformando o vinagre

em dádiva insípida.

Ajudai o pasto de gramíneas

a erguer-se em soberba floresta,

recuperando a paisagem funesta

de pura ignorância dos homens.

Dama dos nevoeiros,

manifesta o teu poder

no constante dançar das nuvens,

na rouca voz do trovão.

Deixa recair sobre nós a cortina

cuidadosamente pontilhada.

Liberta a consciência seca.

Ri do tolo impermeável.

Livra do calvário o sedento

e flutua sua graça sobre o firmamento.

Mistura-te à terra, para ser apenas lama

que se derrubará toda na pálida roupa dos doutores

ou em qualquer formalidade vil.

Cavalga o teto dos carros

embaralhando a visão dos motoristas.

Obriga-os a acelerar a atenção

diminuindo a velocidade.

Rega nossas veias fluviais

e borra essa poesia de rimas incidentais.

Estou sem mais...

Estou sem mais agora para dizer-te.

Peço apenas que aceite este abraço

de gratidão e palavras.

É preciso deixar-se molhar para amar-te.

É o que sei somente.

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Nota: Homenagem à minha querida terra. São Paulo da garoa, São Paulo de terra boa.

Felix Ventura
Enviado por Felix Ventura em 03/03/2007
Código do texto: T399479
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