DO PODER DE NÃO SER
Um dia tudo foi.
Então eu pisquei um olho
e tudo deixou de ser
como se nunca tivesse sido.
Eu esqueci o que era
quando não foi mais,
perdi tudo o que tinha sido
quando tudo deixou de ser.
E fui eu mesmo quem piscou um olho,
o olho de criar tudo o que nunca foi...
Um dia estava tudo ali,
na superfície intacta das coisas.
E tudo como que adejava suavemente
a possibilidade de alguma vontade,
alguma necessidade do que fosse ser
ou não ser diante de tamanha perplexidade.
Tudo o que eu não sabia nem vi acontecer,
então não sei porque fui chamar de realidade
este meu pobre sonho que sonhava tudo existir.
Um dia era assim:
algo misterioso nos mistérios,
algo silencioso dentro dos silêncios,
algo tenebroso no fundo da escuridão,
algo temeroso escondido na imensidão,
algo brumoso em dia de nenhuma bruma,
algo escandaloso por trás de alguma visão,
algo duvidoso bem no meio dessas questões,
algo perigoso vindo com essas alucinações,
algo danoso nos mais absurdos impropérios,
algo pegajoso de uma inexpugnável prisão,
algo enganoso, espantoso, algo horroroso,
no seio do mais jocoso dessa falta de razão.
Então abri, de súbito, a boca
e vomitei todas essas infinitas questões,
porque passei a vida engolindo interrogações.
Foi no dia em que a razão ficou louca,
arrancou os cabelos, rasgou a roupa, andou nua em pelo,
a gritar pelas praças e pelas esquinas as suas indagações.
Envelheci dois milhões de anos de repente num só olhar,
e parei de falar, de andar, de lutar, de sonhar, de perguntar...
E foi tão de repente que abri os olhos
e me entupi de todas essas minhas visões.
E abri também os braços e eis que eram asas
foi quando caí para o alto e nunca mais voltei
e nunca mais voei nem nunca mais perguntei.
Um dia era ainda tudo deserto
e ainda estava por se inventar o céu e a terra,
a água que há no rio e a água que há no mar,
o mato, a montanha, a pedra, a árvore, a flor
ou de tudo isso um jeito que desse para se amar
antes mesmo que se pudesse inventar o amor.
E era um dia tudo vazio,
sem essas cercanias e aquelas tais lonjuras,
sem quaisquer alturas e mesmo as profundezas,
sem as belezas existentes ou mesmo imaginadas,
sem as mentiras sinceras e as mais secretas juras,
sem um traço ou um resto sequer de alguma verdade.
E sem essas minhas mais tolas e incabíveis conjecturas
acerca da pequenez que só eu sei e vejo na eternidade.
Um dia tudo era e eu sei que um dia tudo era,
quando inadvertidamente eu suspirei em voz alta
sobre a maravilha de tudo que era e tudo deixou de ser.
E deixou de ser assim mesmo, como se nunca tivesse sido.
Um dia haverá que se consumir de fato toda essa melancolia,
mesmo que eu me perca nesses caminhos nunca percorridos,
ou que fique preso como agora a tudo o que tanto me angustia.
Ah! Como eu quero que algum dia todos esses loucos varridos,
os meus sonhos, que se ponham todos a se revelar aos gritos,
impunes, despejando em tudo os meus desejos mais incontidos,
proclamando solenemente a morte iminente de todos os mitos,
enchendo o eterno tédio da vida com outros insuportáveis ritos.
E que todas essas minhas reles sagradas palavras mais profanas
proclamem a tudo e a todos em todo o tempo os secretos ditos,
revelando finalmente que tudo era como sempre foi um dia
e que nada nunca, em tempo algum, deixou de ser Poesia...
Um dia tudo foi.
Então eu pisquei um olho
e tudo deixou de ser
como se nunca tivesse sido.
Eu esqueci o que era
quando não foi mais,
perdi tudo o que tinha sido
quando tudo deixou de ser.
E fui eu mesmo quem piscou um olho,
o olho de criar tudo o que nunca foi...
Um dia estava tudo ali,
na superfície intacta das coisas.
E tudo como que adejava suavemente
a possibilidade de alguma vontade,
alguma necessidade do que fosse ser
ou não ser diante de tamanha perplexidade.
Tudo o que eu não sabia nem vi acontecer,
então não sei porque fui chamar de realidade
este meu pobre sonho que sonhava tudo existir.
Um dia era assim:
algo misterioso nos mistérios,
algo silencioso dentro dos silêncios,
algo tenebroso no fundo da escuridão,
algo temeroso escondido na imensidão,
algo brumoso em dia de nenhuma bruma,
algo escandaloso por trás de alguma visão,
algo duvidoso bem no meio dessas questões,
algo perigoso vindo com essas alucinações,
algo danoso nos mais absurdos impropérios,
algo pegajoso de uma inexpugnável prisão,
algo enganoso, espantoso, algo horroroso,
no seio do mais jocoso dessa falta de razão.
Então abri, de súbito, a boca
e vomitei todas essas infinitas questões,
porque passei a vida engolindo interrogações.
Foi no dia em que a razão ficou louca,
arrancou os cabelos, rasgou a roupa, andou nua em pelo,
a gritar pelas praças e pelas esquinas as suas indagações.
Envelheci dois milhões de anos de repente num só olhar,
e parei de falar, de andar, de lutar, de sonhar, de perguntar...
E foi tão de repente que abri os olhos
e me entupi de todas essas minhas visões.
E abri também os braços e eis que eram asas
foi quando caí para o alto e nunca mais voltei
e nunca mais voei nem nunca mais perguntei.
Um dia era ainda tudo deserto
e ainda estava por se inventar o céu e a terra,
a água que há no rio e a água que há no mar,
o mato, a montanha, a pedra, a árvore, a flor
ou de tudo isso um jeito que desse para se amar
antes mesmo que se pudesse inventar o amor.
E era um dia tudo vazio,
sem essas cercanias e aquelas tais lonjuras,
sem quaisquer alturas e mesmo as profundezas,
sem as belezas existentes ou mesmo imaginadas,
sem as mentiras sinceras e as mais secretas juras,
sem um traço ou um resto sequer de alguma verdade.
E sem essas minhas mais tolas e incabíveis conjecturas
acerca da pequenez que só eu sei e vejo na eternidade.
Um dia tudo era e eu sei que um dia tudo era,
quando inadvertidamente eu suspirei em voz alta
sobre a maravilha de tudo que era e tudo deixou de ser.
E deixou de ser assim mesmo, como se nunca tivesse sido.
Um dia haverá que se consumir de fato toda essa melancolia,
mesmo que eu me perca nesses caminhos nunca percorridos,
ou que fique preso como agora a tudo o que tanto me angustia.
Ah! Como eu quero que algum dia todos esses loucos varridos,
os meus sonhos, que se ponham todos a se revelar aos gritos,
impunes, despejando em tudo os meus desejos mais incontidos,
proclamando solenemente a morte iminente de todos os mitos,
enchendo o eterno tédio da vida com outros insuportáveis ritos.
E que todas essas minhas reles sagradas palavras mais profanas
proclamem a tudo e a todos em todo o tempo os secretos ditos,
revelando finalmente que tudo era como sempre foi um dia
e que nada nunca, em tempo algum, deixou de ser Poesia...