Necessário mudar

Ai, quando se afasta o dia, esgotando, junto, todo o ruído;

Ai, onde impera agora o silêncio – já sem sons e luzes de carro -,

Já sem meia dúzia de escândalos pessoais desnecessários;

Ai, vem aquela melancolia doce e serena, bem lenta.

Ela meio que nos busca – se encarrega de nós, e nos prende.

Então, feito bicho estranho que somos, deitamo-nos em nossas camas, queixosos.

De pronto, iremos mudar.

Sim, iremos mudar!

Amanhã ao acordar, seremos.

O que? Ora, não importa...

Algo tanto diferente do que se mostra hoje, por hipótese,

Pois somos falhos.

Pequenos pedaços de areia cósmica, falhos.

Enraivecemo-nos, enlouquecemo-nos (este por um segundo, é certo).

E, num instante de segundo, o mundo é a culpa do que nós somos,

Mas estamos deitados.

Já não há nenhuma ação, naquele momento ímpar,

Que nos dirá que aquilo que somos não é.

Então refletimos.

E dizemos – de novo! -: amanhã não.

Amanhã tudo muda.

Serei diferente, eu sei.

Só que acordo.

Acordo e o mundo de ontem – o ontem das reflexões e revoluções – é o mesmo de hoje.

Seco, árido, entediante.

Já o fim?

Não, já que, como humanos que somos, estamos fadados a, nem que seja em última instância, crescer.

Relatamos, ansiamos por outra noite (outra reflexão, outra transmutação),

E dessa vez aproveitamos. Mas apenas um milésimo.

Conscientes, entretanto, que nesse curto espaço de tempo em que, minudenciosamente, transformamos,

É apenas o amor quem impera.

Puro e simples: amor.

Pois quem se corrige, antes de tudo, ama;

Quem reverte sua própria amargura, antes de tudo, ama;

Quem se muda, não porque dizem que é necessário mudar, mas porque sente que pode ser mais que aquilo que aparenta, se ama,

Pois amar é a essência do que somos

E buscamos.