NO PALCO
Eu cantava Lupicínio Rodrigues. Rubem (o J.L. da minha vida) na última fileira da plateia, sabia que NERVOS DE AÇO não estava sendo cantada para ele. Certamente, eu não pensava em Rubem, nem mesmo seria capaz de enxergá-lo ali, no fundo, me ouvindo a cantar NERVOS DE AÇO para Daniel, para Daniel, que não estava ali, que não poderia estar ali. Cantava para Daniel, mas não pensava nele nem em nada. No palco, a sós, um violão, NERVOS DE AÇO, minha voz.
Maurício também estava entre os ouvintes, mas, ao contrário de Rubem, numa das fileiras próximas do palco. Também não podia vê-lo enquanto cantava FLOR AMOROSA, sua preferida: ninguém enxerga nada quando se encontra do lado de lá da plateia. Não via Maurício, todavia, só a certeza de sabê-lo ali, ouvindo-me a cantar FLOR AMOROSA, modinha dos tempos de inocência, preenchia-nos com toda nossa infância e nossa primeira juventude. Maurício e Ana (meu nome no livro do qual este texto faz parte, o livro que, provavelmente, jamais possa vir a ser publicado), como dizia, Maurício e Ana, que permanecem um dentro do outro rios profundos, há muito sem pedras pontiagudas nos respectivos leitos.
P.S. Neste final do dia 29 de setembro de 2012, contemplo este meu texto escrito já há mais de uma década e me abismo em saudade do meu canto e da minha voz, em saudade de Daniel, em saudade de Rubem, em saudade até de Maurício (tão próximo Maurício, próximo sempre, muito distante dos meus lamentos, e isso é bom); me abismo também, tanto quanto, de saudades do futuro, o que me faz lembrar de versos que escrevi há incalculáveis anos, que ofereço a tudo e a todos que não mais poderão haver nem ser. Dizem, diziam assim, mais ou menos, esses versos que foram escritos há tantos tempos de mim, mas, sempre se renovam, doloridamente:
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De tão pensado
de intuído
o próprio Novo
já tem passado
já tem olvido.
Reescrevo e exorcizo estes meus versos, ao mesmo tempo: que não sejam sempre vaticínio, que não o sejam sempre de tudo, Amém!
No início da madrugada de 29 de setembro de 2012.