Menina Poeta
Menina poeta
Busco-me desesperadamente.
Como o garimpeiro, o olhar fixo na bateia,
a procura do brilho do ouro ou o irradiar do diamante...
Num movimento simétrico,centrífugo,
olhar atento no redemoinho de areia.
Esperança de liberdade, a cada cadenciado movimento.
Na razão, no coração, na solidão...
Repentinamente cúmulos e nimbos... o dia escurecia.
Relâmpagos a riscar o céu
E o reboar dos trovões, em assustadora fúria...
Prenúncio do temporal prestes a desabar.
Medo, ansiedade, temor, pavor, horror..,
desembalada carreira,para proteger-me.
O coração, em tumulto ,ameaçava parar, acho...
E como auto defesa a socorrer-me e
amenizar meu desespero: a bradicardia.
O tempo escoava e com ele a enxurrrada esvaia-se.
A lua, o céu iluminava.
Versos mancos começava a fazer.
Não importava.. Eram meus.
E por mais paradoxal que possa parecer,
sinto saudade de minha infância.
Saudade da morenice acentuada pelo pino do sol,
da lida na roça, da vaca malhada,
do contato macio da penugem dos pintainhos
da ninhada da minha galinha pintada.
da sonoridade da gostosa nascente.
Do ritimado bater do monjolo
e o barulho saudoso da mó a expelir o fubá amarelinho,
do milho que ajudara colher.
Lembranças esparsas em meio ao pesadelo de pancadas.
Costas arqueadas ao peso de enormes balaios de comida pro gado.
Respiração ofegante. A boca sedenta de água. Suor escorrendo...
Salgado, como lágrimas do oceano, embaçando-me o olhar.
Pes descalços, feridos,terra quente a estourar bolhas.
Até que certo dia... sol esturricante...
Cansaço... silêncio. Tudo parado e quieto.
Dominada por um sono letárgico, apaguei.
Aos berros do" carrasco" a empurrar-me, acordei.
Palavrões que repetir, capaz não sou.
O dicionário certo dia consultei.
Lá , definições, encontrei:
Como encaixar-me numa delas,
Nos meus incompletos onze anos?
Confesso... não sei.!
Vencer o cansaço, cabaleante,
para das agressões me livrar
Urgia de pé ficar...Levantar o pesado balaio.
Os joelhos, no entanto, insistiram em dobrar-se,
negando-se a obedecer as ordens do" capataz."
E a escuridão de novo se fez.
Meu rosto estatelando-se no capim cortante
que do balaio escapou,
é a última lembrança que daquela tarde me restou.
Que força mantinha o tênue fio que me ligava a vida
que mal começara e tanto me exigia?
Comida escassa, vestidos de chita
Mãos calejadas,pés feridos.
Quantos sonhos desfeitos naqueles anos idos!
E hoje, apesar de recordações doídas,
da carência,afeto, de carinho,
de alguém para ouvir minha rimas
eu lamento na maturidade, já sem forças
as mutilações sofridas, sangrentas, seguidas....
e sinto saudade da menina-maria,
que, na sua sofrida inocência, versos já recitava
em meio as pedras do caminho...
Maggá. 18 setembro/2012