Um cadáver (Pedido)
Quando eu morrer, não me velem entre flores mortas, muito menos entre flores vivas.
Não insultem a fragrância da primavera com a indelicadeza plástica do irreversivel ato da dissolução.
( Não maculem as flores com a minha presença. Não ofendam os olhares à minha palidêz ).
O Cadáver tem um cheiro peculiar - Passivo e mórbido - Quase todos soltam gases, mesmo em plena liturgia. Uma maneira discreta de afastar a indesejável presença dos vivos.
Não gosta de ser observado. Se pudesse falar, expulsaria a todos da sala.
O velório é um ato de sadismo!
Não exponham uma vida anárquica e repleta de movimentos, olhares indagadores, gritos, suspiros, lágrimas, à passividade das coisas mortas. A minha anarquia não quer ser humilhada pela unanimidade de velas e castiçais.
Perdoem pelo meu verbo angustiado. Exijo respeito com as minhas ruínas!
Transformem esta matéria frágil, solúvel, que me serviu com alegria e zêlo, em cinzas, carbono, minerais, e devolvam ao mar!