A DOR DO PARTO (PARTIDA) 
Por Carlos Sena

 
Tem dias que a gente se sente, literalmente “como quem partiu ou morreu”.
Chico Buarque, em uma das suas mais belas canções trata disto como ninguém. As canções tem também essa função social, qual seja a de nos acalentar diante dos fatos que acontecem conosco e que nos levam a sentimentos idênticos ao da canção de Chico. De repente a gente se acorda solfejando uma canção como essa como se fossemos nós nos os autores.
Tem dias que a gente se sente como quem partiu.
Não sei QUAL é o pior: se “partir” ou se “morrer”. Não a morte do corpo. Mas, a morte dele em vida, ou seja, a morte de sentimentos que não podem ser enterrados, nem condizem missa de sétimo dia, nem publicação de “santinhos” com a nossa foto. Há luto, isto sim, no rol do simbolismo que nossos dias “nublados” “escuros” facultam. Dependendo, partir ou morrer não fazem diferença. Exceto quando se vai embora para longe ou para a eternidade em função natural do existir. PARTIR seria, pois uma forma de morte, embora saibamos que MORRER é levar consigo a PARTIDA eterna. 
Partir é doloroso, principalmente quando se parte deixando pra trás um grande amor. Um grande amor HOMEM X MULHER X OUTROS. Porque há outros amores que partimos, muitas vezes, sem essa certeza: partir de um ideal, partir deixando pra trás amigos diletos, companheiros de ofício. Partir sem saber o que nos reserva o futuro que só Deus sabe o que será. Partir, acima de tudo, dos nossos sonhos que não sabemos se tornaram em nós pesadelos. Morrer do corpo não dói. A despeito de que nós sempre temos medo de morrer, de partir desta pra “melhor” (?), essa não é, certamente a pior morte. Essa é sim a nossa maior certeza. Sabemos dela desde que morremos. Outras mortes, não. Morrer por dentro diante de uma grande perda de quem amou é visceral. A morte de Jasão que perdeu todos os seus amores talvez seja das piores, senão a pior. Cercear alguém do contato de quem se ama é morte violenta. Medéia fez assim com Jasão na conhecida tragédia Grega adaptada por Chico Buarque com o nome de GOTA D’AGUA. Ele (Jasão) teve que permanecer “bulindo” em vida, cercado pela ausência da morte dos filhos e dela própria, Medéia, a quem tanto amava.

Tem dias que a gente: ora parte, ora morre.
Ora acorda, ora dorme.
Ora aparece, ora some.
Ora bolas, ora bolas.
Por que a gente tem que em vida partir e em partindo morrer?
Pela certeza de que a vida é mágica?
Ou pela ilusão de que amanhã é outro dia e não devemos nos preocupar com ele, sob pena de declararmos nossa pouca fé?