Professor... faça um pão

Professor...

Faça um pão. Sem ciência e sem medida.

Meta a mão na farinha suave e branca.

Ovos... manteiga... e misture... e sove.

Sinta o amaciar.

Deposite no ato a raiva, a angústia, o desencanto, as interrogações. Deixe que os dedos desapareçam na massa e que pesem sob os ingredientes grudados.

Esfregue as mãos, uma na outra.

Os pedaços que se soltarem vão se unir novamente, no aperto seguinte.

De coisa grudenta e disforme vai se originando outra, lisa, de bom aroma, redonda ou não, como queira.

Então amolde. Brinque um pouco.

Dê asas à imaginação!...

Crie jacarés, ou patos, ou potes encantados, ou feras... ou anjos... ou discos... ou parênteses... ou números...

E desmanche... E sove novamente.

É preciso que os braços doam.

Essa é uma dor gostosa de doer...

...

Minha avó ensinou que ferro em brasa queima, mas esqueceu de dizer o que é queimar!

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Faça um pão.

Colocá-lo no forno é coisa muito séria. Significa alimento para o corpo. E o fim das alternativas para a massa. Só coloque no forno quando estiver suficientemente cansado. Exausto mesmo. E se achar que vale a pena.

E se considerar que já é o momento de fazer outro pão.

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Gato que nasce no forno é pão?

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O prazer de ver o pão crescendo, só se compara com o de clarificar a própria concepção de mundo.

Embriague-se com o aroma.

Cheiro nenhum tem tanto poder de trazer recordações...deixe que as significações aflorem - não tente contê-las...

Seja forte o suficiente para não se deprimir com a depressão!

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Há purpurina nas mãos?

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Derreta no pão quente, a manteiga pura e sem sal.

Com o miolo, faça bolinhas...apague as marcas do caderno pobre...reescreva as memórias...

leia a vida nessas páginas...

emocione-se com a fraqueza...

não tema as lágrimas que aflorem...

Há sempre uma que pinga exatamente na palavra esperança...

...o fogo a faz brilhar...

E é tão bonito o sorriso, num rosto molhado!

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Já viu que linda é a palavra lágrima?

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Faça um pão. Sem ciência e sem medida.

Há rituais no corte.

A ponta significa um caminho.

A quem serví-la?

Que se proíba cortar pães com faca.

Só cortar com os dedos.

Como quem reparte.

Que os pedaços sejam desiguais e distribuídos aleatoriamente.

Sem justificar.

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Professor: faça um pão.

Sem ciência e sem medida!!!

reginaLU