As Searas da Auto-Ilusão
"O quê?" Você me vem com esse discurso demagogo de positividade pueril sobre o lado bom das pessoas, do mundo, de se viver!? Acorda teus olhos, acorda teu despertar; você é tão podre quanto todos os mártires beatificados ao longo da história humana pelas igrejas ó meu prezado suíno bípede tão terno, com estes olhos que respladecem compaixão e espinhos venenosos. Estou exagerando? É o que estás tentando me dizer? Você é o Diabo e Deus intrísecos e unificados na comunhão eucarística de teu corpo, nas fezes intangíveis de tuas ideias, nas vicissitudes nauseantes de teus impulsos que fluem mais rapidamente do que todos os dinamismos empíricos e conceituais que a Física e a Ciência vomitam de seus navios nos livros que os olhos pensam que conseguem ler e compreender, mas a automatização quântica, mecânica e gramatical seguem domesticando as jaulas inomináveis que jamais dormem nem nas vigílias hibernais de nossas almas a cada noite... A cada noite!!! Cada-Nada-Noite... A cada noite nem morremos e nem nascemos; a cada noite a qual é mais profunda e labiríntica do que as primaveras desérticas da Luz que a humanidade afirma amar, afirma querer possuir, e continuamos todos a ser as cinzas opacas de inutilidades que, por um breve interstício sonoro da mente, somos vassalos de alguém ou de algo, ou de nada, mas somos efemeramente. De novo... Achas tu que estou sendo pessimista sobre tudo? Não estou não seu imbecil: não sou nem prático e nem abstrato; não sou soldado de causa nenhuma; não sou filósofo ou cientista de conjecturas circulares, ou retilíneas, ou lucrativas, que brinca de ser amante aos sábados de ecologia, e de segunda a sexta se veste de burguês crítico; mas ao dobrar a esquina já se torna marxista piegas, metendo na carteira os centavos capitalistas com que nos prostituimos. Eu falo demais? Você acha isso? Tuas opiniões assim como meus discursos são tão inúteis como a luz solar neste planeta. Eu olho ao redor: não há mais seres humanos, só máquinas cegas sempre famintas, sempre entediadas, sempre criando festas, sempre encobrindo suas fugas, sempre buscando o que não possuem; sempre acreditando que conquistaram o que pensaram ter em suas mãos; sempre vitoriosos ou derrotados; sempre reclamando que algo faltou, ou que se deram bem no que desejaram; sempre as mesmas, sempre iguais, sempre diferentes da própria incongruência; sim, estou certo, não há mais seres humanos neste mundo; não há mais imperfeições; só há um monte de esterco de palhaços finitos, doentes, mascarados, escondendo seus rostos, ocultando suas almas mortas, rindo de suas ridicularidades como se fossem troféus, como se tivessem desenterrado e finalmente encontrado a verdade sobre a vida, mas não... Nunca é... Jamais foram... E os espelhos de suas retinas refletem o vazio que os mesmos preenchem com escombros e fósseis de matéria fecal que eles chamam de “necessário e essencial” suas almas movidas à gasolina, a sexo grotesco, a dinheiro fresquinho encharcado de sangue e mentiras; bilhões de almas movidas pelo nada físico e abstrato que eles denominam de “vida”, mas que cheira fetidamente a rotinas, a medos, e a trovoadas de estupidezes. Então você liga o computador como se fosse um ritual religioso, e tudo recomeça idiopaticamente.
Nossas alegrias são abismos de tristezas camufladas com belas roupagens requintadas por convencionalismos pecuniários, ou habitualizadas ao redor da fogueira pagã que esfumaça nosso heroísmo covarde, e nossas conquistas homicidas. Sentes este gorduroso tédio de sempre estar cansado, ou te vestes com a indiferença perante teu cansaço de sempre estar entediado? Olhaste o sol hoje pela manhã? O que não viste ao contemplar o teu sol eclipsado? Nosso maior pecado é continuar a querer existir não importa que nunca saibamos o que seja existir. Nossa grande virtude e fé são não conseguir medir a profundidade de que nem vivemos e nem deixaremos de morrer. "Não-ser" não é suprema questão, mas é este maldito corpo fonológico que se chamamos de "ser", que acreditamos "ser", que duvidamos "ser", que escondemos "ser", que tanto supomos "ser", enfim, é este "ser" que dilacera a tudo, e este tudo foi engravidado pelo Vácuo onipresente que não explica nem a Deus sua origem divina e desconcertante.
Tudo bem, ok... Eu estou errado em tudo o que eu lhe disse. Você sabe a resposta. Suas explicações cadavéricas te deixam feliz? Que bom então. Continue semeando as boas-novas na estrada da auto-ilusão meu amigo. Minha solidão aguarda sedentamente minhas herméticas palavras vãs.