ARQUEOLOGIA DO AMOR
Não é mais uma questão de pele ou de afinidades, os ossos entrelaçados são testemunhas perenes dos nobres sentimentos do gênero humano. No período neolítico, quando as palavras ainda se mostravam escassas e os gestos poliam as realidades, dois jovens foram enterrados juntos num abraço que nenhuma força da natureza poderia separar.
Por coincidência, ou providencial acaso, o local dista apenas quarenta quilômetros de Verona, cenário do amor de Romeu e Julieta, imortalizado por William Shakespeare. O sítio arqueológico de ocupações pretéritas aproxima-se das angústias e anseios contemporâneos de ausências presentes. A fantasia dos jovens amantes permeia nossos anseios e dá corpo aos sonhos da mocidade cheios de arrebatamento e paixão. Palpitações, desejos, descobertas... A vida no limiar da morte, ser o outro mesmo que num plano improvável...
Para os mortos já não existem verbos a serem conjugados. Contudo, a ternura das circunstâncias e a intensidade da entrega são vestígios arqueológicos que podem ser encontrados em todos os que incorporaram as próprias narrativas e que, em muitas ocasiões, não valorizam os achados e os soterram em baldios esquecimentos.
Dois corpos enredados numa só alma. Dois jovens amantes, irmãos, amigos... As análises dos laboratórios poderão recompor muito da estrutura dos esqueletos, ligados sob as peles do tempo, e das ferramentas de pedra, pontas de flecha e a faca, artefatos característicos do período neolítico, mas a emoção que originou o abraço nunca poderá ser reconstituída e deverá permanecer para sempre como uma ação a ser abarcada pela humanidade.