Sobra Você...
Ainda resta um pouco do seu gosto em minha boca, ainda resta um pouco do seu cheiro em algumas de minhas roupas, ainda há pedaços do que é você tão dominante em mim... Ainda tem resquícios de você, na decoração da casa, tua presença ainda está no sofá, no movimento dos lençóis e um resto de sorriso naquela música que costumávamos ouvir... As mentiras ainda estão lá, onde a vida pulsa, isto é, em todo lugar em que você me amou... O que estaria correto?
Brincamos de serem crianças, nos sujamos na lama e algo ainda se desfaz em mim quando me lembro do seu verde olhar... As verdades inexatas do amor ainda se escondem embaixo da incerteza do encontro... O passado em nada nos ajudou a remover as pedras da dúvida... Como definir o que é certo, se a verdade foi contigo por aquela porta e o que sobra de mim? Eu simplesmente não sei... Ainda tem um pouco de você, em todo o que eu faço... Nada do que era correto, tudo se desfaz em tragos e fumaças que a vida leva, na brisa da noite! Tudo o que me lembra de você é vago, é incerto... Reza apenas até acabar a vela, que queima no que sobrou do amor...
Seus fantasmas me perseguem durante todo o final de semana... Provo sua sobremesa favorita, só para me maltratar... O que é forte é o que foi e não poderei mais sentir... Você não chega pela porta aberta, somente o som do vento bagunçando os meus cabelos e embaraçando a sombra cinza que sai do meu cigarro, dançando em movimentos aleatórios para me seduzir... Como seu ventre quente deslizando de um lado a outro, serpenteando com pedras preciosas o barulho da felicidade... Não precisava de mais... Ainda estou sozinho e fechado em tudo o que aconteceu... Tempestades me falam sobre nossos sentimentos e sobre o que vivemos nada mais vai voar, apenas os vasos e os pratos na direção do meu desespero: seu retrato na parede... A pintura que diz mais de mim, eu ainda não sei...
Ainda sobra tanto de você em tão pouco que sou eu, que nem sei lidar com essa falta... Reconheço seu rosto em meus erros e o espelho estraçalhado que te aponta, como uma ilusão, como uma miragem, como algo que não preciso ver... Somente o que é correto, grita por essa alma aflita é o próprio ar que espero no escuro desse quarto... Estou trancado em você sem saber como voar... O amor me ensinou o valor da mentira e as pedras, a construir nossos castelos, como crianças na neve... A vida me ensinou a perder... A perder as coisas que ainda nem sei... Ainda nesse espaço vazio que me constitui, há suas lacunas e nas minhas poucas certezas, todas as suas dúvidas... Você ainda me faz peso como bolhas de sabão...
Ainda encontro sua face, toda vez que abro os olhos e vejo lábios que não são os seus... Toda minha vida tem sido falsa, tudo tem sido falso, porque nada disso é você, e nada que seja você é para ser meu... Todos os sons em minha cabeça me remetem diretamente a sua voz, como dardos... As pedras no caminho tem me dado certeza das quedas e você ainda pesa em mim... Flechas, bombas e amarras são como dentes-de-leão... Nessa ciranda que se faz em minha mente, nada menos, nem mais do que sobrou de você...