Uma boa morte.
Uma boa morte.
Ao organizar nesse livro os meus poemas, deixo para quem tiver a generosidade de ler, um pouco dos meus conflitos em forma de poesia. Entres os que lerem, nem todos sofrerão os mesmos sentimentos, alguns podem sentir melancolia, outro tristeza, e outro alegria. São as lágrimas do meu sofrer, juntas com as flores do meu viver, o riso que abafei, o choro que não segurei. Tudo estará aqui limpo, desnudo aos olhos dos meus leitores. A alma inquieta, o homem inconstante. Um gênio impassível, um espírito abatido, às vezes robusto, mas nunca hesitante. Todas as confusões emocionais, eu, de forma clara expus sem medo de agradar ou de magoar alguém. Disse para mim mesmo, coisas que sempre quis encontrar alguém que tivesse coragem para me dizer. Peço desculpas se magoei, sobretudo os meus entes queridos. Aos filhos perdão eu suplico, pois sei que não fui tudo o que eles esperavam de mim. Para todos que me suportaram um abraço de gratidão. Haverá um ou dois que sentirá saudades minhas, outros, e nesse caso a maioria, alívio. Nunca pensei ser unânime entre os com quem convivi, nos olhos de muitos vi a inveja, o despeito mórbido por me terem no mesmo rebanho. Todavia, quero também dizer, e isso com toda força moral que me resta, que para praticar a política da boa vizinhança eu tive que engolir muitos sapos, não raro, de seres nanicos que me apresentavam como nobres lideres, quando na verdade, deviriam ser mordomos.
Todavia, alguém pode perguntar, enquanto vivo, por que razão este prenúncio de morte, esta despedida? Então, eu já o respondo:
Sei o quanto efêmera é a vida, e que muitos homens mesmo entre o mais sábios não aceitaram esta sombria realidade. Eu, há muito, me preparo para ter uma ‘boa morte,’ seguindo o conselho de um grande sábio, que não se preparou, mas que ensinou, que depois de vivermos as coisas mais importantes, depois de conquistarmos pelo menos, parte dos nossos anseios, é preciso planejar a nossa partida para a inexistência.
O que seria uma boa morte? Não se trata de resolver as questões de cunho emocional-parentesco. Digo que é preciso se contentar com o pouco, ou com o nada que temos, encarará a morte como encaramos a vida, ao descobrirmos que era preciso viver e lutar pela sobrevivência.
A morte é muito mais suave que a vida; não teremos a luta árdua de cada dia por uma porção de água e pão. Significa isso que nada temos que levar, nem bolsa nem alforje, apenas a cara e a coragem, para não agirmos como Sócrates, que assombrado ao pegar o trem fantasma da morte, pediu clemências aos deuses do olimpo, e mandou que lhe pagassem uma dívida de jogo.
Eu acrescento a isso, o fato de que, até grandes filósofos tinham a mesma dúvida que têm os inocentes nesse aspecto da morte, e o que pode existir no abismo da inexistência não está claro para ninguém, ou se está, é para poucos. Para mim existe uma certeza simples: não haverá trabalho nem ansiedade no além túmulo. E o que devo fazer, preciso fazer hoje, pois não terei outra chance. Portanto, faço hoje o que tenho que fazer, por isso escrevo minha autobiografia para que outro não me trate com desrespeito, a julgar por minha idiossincrasia, e não por meu modo real de ver as coisas. Pois, o temperamento de um homem é forjado pelas convenções e não por sua alma distinta, única, que habita dentro de si, e que não vive para que todos possam ver claramente. Geralmente, é no fim da vida que vem à tona a real personalidade, sobretudo dos artistas que não conseguem ser libertos na tenra idade.
A todos que ficam por mais um pouco, um forte abraço.
Brasília 27/10/2006