MARCAS DO TEMPO

O tempo transcorrera

e saudoso de um tempo

que transcorrera,

nada mais lhe atraia a atenção,

e na cabeça

somente a certeza

que o tempo transcorrera

Viveu cada momento

como se fosse único

e era feliz

porque, dizia,

a felicidade,

mais que um alcance,

um estado permanente,

a felicidade

não passa de um simples

lampejar de felicidade

e que tem o dom de reverberar

por todos os lados

e todos percebem,

é como o sol:

mesmo não estando

diretamente em "você",

voce sente porque aquece o ar

E, então,

naquela manhã,

diferente de tantas outras,

a certeza da passagem do tempo

lhe fez pensar nos amores,

nas dores, nas chegadas e partidas

de amigos que foram e voltaram

Não ficou por muito tempo

porque no instante seguinte,

lembrou-se que o tempo

lhe registrara na alma,

mais que marcas da guerra,

mas que marcas do cárcere,

mais que marcas das dores;

o tempo lhe registrara na alma,

marcas de vida,

de uma vida vivida

em toda sua plenitude,

em toda sua grandeza,

e mesmo diminuta, às vezes:

corria-lhe lágrimas dos olhos

quando pensava no Holocausto,

julgava, na modernidade,

a coisa mais abominável,

mais tacanha,

mais animalesca

o que uma idéia, doida idéia,

não seria capaz de produzir. Até onde,

o ser humano seria capaz de chegar e fazer

para impor sua visão de mundo

E então, ele chorava

e via que o tempo passou e deixou sua marca

E já tomado pelas marcas que o tempo

deixou na face,

naquele dia, especial dia,

viu que a vida é feita de momentos,

e a felicidade de estados

que se perduram na memória:

naquele dia, a vida

lhe presenteara

com a chegada da primavera

e nisso, ele sabia,

havia a chance de novos jardins