::: Stand By :::
SINTO FALTA DO QUE EU ERA ANTES desses dias gelados. Antes da era de solidão, eu era uma garota que gostava de sonhar e que não se preocupava com a opinião dos outros. Mas o mundo me cobrou um pouco mais, um pouco mais de tudo, de tudo o que eu não tinha. Eu passei a ter, mas para isso eu tive que renunciar muito do que eu gostava. Como minha amiga Maria disse, eu repito: "Cada escolha, uma renúncia", disse bem. Não sei se posso chamar esse rito de passagem da minha vida de amadurecimento, acho que não. Talvez soe melhor "identificação" ou até mesmo "metamorfose". Eu me encontrei, eu me descobri totalmente, como se um pano fosse tirado do meu corpo. Estou "eu" e mais nada. Estou pé no chão como nunca estive e eu não gosto disso, mas é necessário. É o real. Eu gostava da época em que eu me preocupava e gastava meu tempo em criar diálogos utópicos, que só existiam na minha imaginação. Eu gostava dos meses em que meu coração esquentava e dos dias em que era possível perder o ar e continuar vivendo. Eu gostava do tempo em que eu deitava e me permitia sonhar. Sonhar com coisas boas. Mas meu travesseiro está em "stand by", nem mesmo uma carta consegue reavivar minhas memórias. Acho que estou petrificando. Eu tive que bloquear muitos sentimentos e foi tão brusco, tão de repente, que não sei se seria capaz de sentir outra vez. Espero que alguém me mostre, nas teias do meu tempo, que eu ainda sou capaz de sentir.
Mas a menina de outrora, aquela que gostava de sorrir sem perceber, ela não existe mais. Porque a vida me ensinou, mesmo sem minha permissão, a ser mais dura.