o Poeta e o Matemático

Há tempos percebi

que dentro de mim vivem personagens vários,

ora em conflito,ora em harmonia. Interdependentes

como siameses.Suas vidas entrelaçando-se,

miscigenando-se sem lisura, sem finura, sem fissura.

Conflitos, contrastes, semelhanças, inconciliáveis

diferenças,arengas, pendengas, encrencas.

A um tempo uma paixão avassaladora como sói

ser este sentimento sem pé nem cabeça, rédea solta:

linha tênue entre loucura, demência, compostura

mistura de êxtase e dor, pendor,furor, fuga, ida sem volta.

Entre tantos, dois sobressaem-se, atropelam-se.

conflitantes, complementares, conciliantes, contrastantes.

Exigentes, maleáveis, intransigentes, enquadrados

Mas eu os adoro.

O MATEMÁTICO. Altivo,por vezes petulante. Sintético.

Amante das Exatas,para ele não há enigmas.

Stricto sensu, lato sensu.

Exibindo altaneiro seus algarismos e uma profusão de sinais.

Por vezes, traje a rigor, óculos de grossas lentes - sinal dos anos somados.

Outros, mais jovens, rabo de cavalo - para que se pentear?

Irreverência...Calça jeans desbotada, desfiada, é claro.

Tênis, talvez da 25 de março.

Camisa com frases de um inglês dúbio.

Ousadia inconsequente. Juventude a aflorar.

Para que usar a letra "X" na multiplicação. Basta um ponto.

Há, ainda, chaves {impedindo a entrada de intruso}

Os parênteses (ainda bem que não são parentes).

Que as vezes mordem a língua da gente.

Os colchetes [para abotoar os coletes, os corceletes, esconder bilhetes].

Outros símbolos , confesso são lindos, como o "infinito".

Que imita um oito deitado, delgado, sensuais curvas.Que folgado!

Tenho a sensação que sempre uma maliciosa piscadinha,

para a aluna gostosona, gostaria de mandar.

"Somatório" sem ele a estatística não funciona.

Raiz quadrada, cúbica.No meu quintal só vi raiz redonda.

Não é engraçado?

Alguns adoram nomes mais aristocráticos

para seus símbolos nominar.

O "Lemniscata do suiço BERNOULLI.

Este simbolo é um laço de fita bem grande, feito com esmero,

a enfeitar os cachos da aluna Ana, define o poeta.

"Leminiscata´é um símbolo formado por uma curva plana fechada,

consistindo de dois laços simétricos que se encontram em um nó.

Representa a curva algébrica do quarto grau de equação cartesiana.

Bernoulli é considerado o pai do cálculo exponencial"

Indignado, intervem, enfático, o matemático.

- E quem será a mãe??? O poeta não conseguiu ficar calado.

- Este assunto não é de sua alçada, poeta ignato!

O matemático já estava ficando irritado.

Meu Deus, uma arenga, bem no meio do meu poema!

Produtos notáveis. Radicais, logarítimos, tabela periódica,

probabilidade, teoremas, percentagem, fórmulas e mais fórmulas...

Desespero dos estudantes!

E, agora, na era virtual, adora o @.

Malandro, sempre vem acompanhado do" ponto com."

Média geométrica, média aritimética ponderada. Moda...

Mas o que mais me intriga é o tal de expoente zero.

Este danado faz tudo virar um.

Sinal de divisão virou dois pontos, até razoável.

Incógnitas.... Fração: dividendo em cima, traço,

divisor logo abaixo.

Pronto. Matemático também é maleável.

Defende suas teorias, fórmulas, cálculos sem fim,

o dia inteiro a nos atormentar.

Inventou até um jeito de medir o tempo.

E agora a vida não pára.

Não foi só pra avacalhar?

Retas, curvas, palalelas que se encontram no infinito,

Como?! Afinal o infinito não tem fim.

Pêndulos, prá lá e prá cá. Ângulos. Bissetriz

Ah, Como era irresisitível aquela colega

de requebrado andar, estoteante olhos verdes

que para o professor se insinuava,

provocando suspiros e uma vontade louca de sorver

Cada imperceptível resíduo do perfume importado

da menina-mulher Beatriz,

olhar lascivo, pose de atriz.

Mas eu sou fã, mesmo, é do POETA. Seus amores...

Parceiros ideais, coloreando a vida,encaixe perfeito.

Horas a fio.Na penumbra, ao sol abrasador, sonhador,

ou ao relento, em noite enluarada.

E, no dizer do poeta, sobre o alvor da manhã

desvirginando a madrugada.

Lá está ele. Lá estamos nós, em todo ou em lugar algum.

Travesseiros macios espalhados, amassados...

Pra que luar?

O sereno, suave, delicadamente pousando nos corpos suados

que se confundem na relva.

A rolarem, descompassados.

Sobre o sereno, ou sobre o cetim do lençol,

o aconhego do amor, depois do amor.

Adoro as peripécias do poeta. Seus poemas, versos, textos, rima sátira, crônicas, estórias. A registrar para gerações futuras,

o instante, o agora. Dá-se,até,ao luxo de soltar palavrões

que em certos momentos nos lava a alma,

extravassa nossa inadimissível humana ira.

Vulcão em erupção.

Mesmo mudo, seus sentimentos fluem.

Faz em silêncio seus poemas. Cantigas doces, líricas.

que deslizam,em cadenciado ritimo, no rosto da amada,

em forma de mornas e sentidas lágrimas.

Cristais adornando a tez da morena ou da loura, suavemente.

Cada um escolheu sua morada.

Os números adoram deambular pelo emaranhado de neurônios.

Cuidados para um curto-circuito não provocar.

O poeta escolheu o coração que, anseia, não pára de pulsar.

É de lá que faz jorrar - incessante- seus versos, suas rimas.

Descarrega sua adrenalina.

Versos transbordantes de tristezas, mágoas

decepções, esperança, vontade. fé, vitórias.

E quando,por descuido, abre a guarda, nocaute certeiro.

Beija a lona. Busca desesperada por ar, que lhe escapa.

A luz apagou. Ao redor da sua cabeça,

a girar, um corrossel de estrelas.

Forças e músculos o abandonam.

Estendido no chão, qual boneco de pano, sem pose,

Expõe entranhas esfarrapadas, no centro do rinque.

Será esta a verdade do homem?

Será isto o "viver"

Corpo e alma.

Mente e coração.

Razão e emoção;

Cair e levantar.

Criar, sentir, amar.

Rir e chorar.

Busca eterna do olhar divino que acalma,

acalanta, acolhe. Revigora.

Sempre de braços abertos

para receber o poeta, o matemático.

E toda a humanidade,

prodigalizando a paz.