Metáfora Transcendental: 'Seixos' e 'Homens'

“Sentir, pensar, escrever… comunicar-me com os demais, é este meu modo de viver: SER, humanamente SER e tentar sempre transcender-me…”

Antes do por do sol, quando as cores douradas começavam a bailar diante dos seus olhos e os pássaros cantavam sua última canção, ela passeava às margens do rio da sua cidade natal e deliciava-se com as fragrâncias que exalavam das plantas, da terra e do rio naquela hora sempre especial do dia …

Com a alma em paz, sentou-se sobre uma das pedras que lhe parecia confortável, deixou-se molhar os pés pela límpida e refrescante água, e pôs-se a olhar seu fluir tranquilo, como provavelmente têm feito desde tempos que desconhecia.

O Sol inflectia em diagonal seus raios morrentes sobre o dourado rio, o que mais ainda revelava toda a sua beleza.

Seixos únicos, coloridos, gizados, brilhavam repousados na areia – pareciam estrelas da terra a, antecipadamente, harmonizar-se às que em breve surgiriam nos céus … Alguns eram forrados por vivo, suave e aveludado musgo … Não importavam suas formas – se ovais ou elípticas: assemelhavam-se a jóias incrustadas na areia, a mostrar sua natureza única.

Inclinou-se e acariciou um deles. Não resistiu: pegou-o e sentiu nas mãos sua lisa superfície. Tê-lo assim suavemente, fez emergir de si, pensamentos transcendentais que fluíam sem pressa, como o rio a seus pés.

Perguntou-se quanto tempo teria passado desde que, em sendo pedra, foram aos poucos suas arestas buriladas, até o momento específico em que ela então o tinha nas mãos, em sua perfeita forma oval? Quantos milhares de anos? … Milhões de anos? …

E mais… quanto tempo ainda deverá passar até que, de seixo virá a ser areia? … Pó? … Deixará mesmo de existir? …

………………………..

“Como as pedras vão diminuindo de tamanho com o transcorrer do tempo, pela erosão”, pensou: “metamorfose semelhante certamente ocorre também com os homens”… Mas, na realidade, a maioria deles não percebem isso … Não compreendem que deveriam estar a perquirir a transcendência… a buscar o aprimoramento sob todos os seus aspectos… Sequer entendem que não são ainda ‘humanos’: têm apenas sua forma física carecem a essência…

Indagou-se ensimesmada: “Quantas vidas seriam necessárias para que viessem a transformar-se realmente em ‘seres humanos’ ? Teriam mesmo como sê-lo, algum dia?”...

Mirna Cavalcanti de Albuquerque

NOTA REAL

Considerando-se que a população mundial já atingiu mais do que sete bilhões de pessoas e que milhões delas sobrevivem em condições sub-humanas, com pouco ou nenhum tempo restante para aperfeiçoarem-se espiritualmente, pois mal conseguem sobreviver no seu duro dia-a-dia…

Considerando-se ainda o fato de que os cujo padrão de vida é razoável, em sua maioria são regidos por crescente e assintótica ganância e, por assim ser, querem tornar-se mais e mais ricos… Onde o tempo para o espírito? São mesquinhos e materialistas demais para se preocuparem com ele – e muito menos com seus semelhantes….

Jamais serão seixos… restarão pedras brutas: talvez pela eternidade afora… (Ah! Metempsicose…)

Mirna Cavalcanti de Albuquerque Rio de Janeiro, 28 de abril de 2012.