Arder com a Vida





 
             O  cosmos profundo  é frio e silencioso. Um silêncio sepulcral.
            E a natureza, apesar de bela, não responde a  nenhuma de nossas perguntas, ou pelo menos ainda  não a entendemos.  
            Diante desta  visão, nada poética, é que me atrevo, num ato de audácia, revestir este universo da minha delicadeza, com a ajuda dos meus sentidos.
            Salpicar esta frieza com os sais da minha vida, com os sentimentos que a natureza me ofereceu de graça.
            É a resposta que posso oferecer, tentando comover os deuses que criaram esta vida incompreensível e enigmática.
            Shakespeare nos pedia paciência.  Tentarei ser paciente com a vida e comigo mesmo, e seguirei o que dizia nossa Clarice Lispector, “já que não consigo entender, me sentir vagamente, já me basta.”
            Teimar em amar o mundo, abrasar-me, queimar e arder com a vida. Torná-la graciosa, apimentá-la, oferecer o sangue da minha emoção, vibrando como uma corda de violino, que sabe tirar do ar os sons que podem acalmar nossa ânsia de beleza e de felicidade.
            Esse o caminho dos sentidos que temos todos. Nada de mal com eles, desde que, como numa grande orquestra, sejam conduzidos pela maestria da boa razão, comprometida não com um intelectualismo frio e insosso, mas impregnada da grande Arte que nossos sentidos podem oferecer, cada sentido com sua independência e emoção própria, criando a partitura musical do universo. Neste clima de festa de nossas melhores emoções, embriagando-nos com o vinho da vida,  poderemos, finalmente,  dançar com o inconquistável Tempo, doando nossa alegria e brincando com o inescrutável,  até que a natureza,  com seus caprichos,  nos retire de cena.