AS BORBOLETAS.

Por Carlos Sena
Presente, passado, futuro

 
A gente até tenta dizer que o passado passou. A gente até tenta dizer que o futuro a Deus pertence. Na verdade nem o passado se foi como gostaríamos, nem o futuro só pertence a Deus como dizemos. Essa trilogia consegue ser o tudo e o nada da nossa existência por mais práticos que sejamos; por mais que a intelectualidade nos conduza. A razão e a ciência até que tentam nos preencher, talvez pela filosofia, esses vácuos existenciais que o conhecido que nos passou deixa e que o desconhecido que está por vir nos proporciona. Na verdade o grande mistério da vida está no presente. Ninguém chega aonde chegou (o chamado presente) sem que deixe histórias pra trás; ninguém chega aonde chegou sem que entregue ao futuro sua felicidade. Se não felicidade, mas as possibilidades disto. Se nenhuma coisa nem a outra, a ilusão de que o amanhã será sempre melhor do que o hoje. 
Diante dessa configuração realística e subjetiva ao mesmo tempo, filosofia, religião, razão e arte se dão as mãos. Pelo tempo de cada um, a filosofia se estabelece como forma. Pela forma, a religião se concretiza como salvação. Enquanto salvação, a razão delimita o conhecimento que pela arte se reproduz em emoção perene. Até quando o homem vai ser escravo da tridimensionalidade do tempo?
O tempo nos parece o palco do PASSADO e do FUTURO. Mirar-se no espelho nos conduz a esses dois estados de vida. Talvez seja o único encontro que a gente faça entre passado presente e futuro. No rosto refletido, a lembrança do rosto que tivemos. No rosto que gerou a reflexão da imagem, fica estampada a face real do nosso presente. No rosto da nossa imaginação, o futuro que se estabelece nas rugas imaginárias, nos cabelos brancos e no pouco brilho dos nossos olhos tentando vislumbrar a esperança.
Um belo dia a gente se diz novamente que o que passou passou. A gente até diz pros o
utros que quem vive de passado é museu. A gente se esquece apenas que dentro de nós há pequenos museus que o tempo se encarregou de criar sem nossa permissão. Melhor nem tergiversar sobre isto, porque o senhor da vida se refaz em nós através do tempo. Amanhã será depois e a gente nem sentiu que foi ontem. Até que um dia você se dispôs a retornar a terra natal em que nasceu. Todos os amigos de infância que deixamos estão diferentes, envelhecidos. Logo você se acha melhor que eles, porque é normal que assim aconteça. Eles, certamente vão achar que você está derrubado, porque é assim que normalmente acontece. Fato é que a lição do tempo não tem livro certo pra ser aprendida. Tampouco escola certa pra ser ensinada. Melhor viver. Crer que um dia todos estarão do outro lado da vida, mas enquanto isto não chega, busquemos a vida bem ao modo de Mário Quintana (grifo meu): “se a gente não quiser sair por aí em busca das borboletas, basta que cuidemos dos nossos jardins com amor e elas virão naturalmente”...