HAVIA DE SER ASSIM

Tinha um pouco de filosofia
Que tudo perguntava e tudo sabia,
Que tudo de certa forma entendia.
A poesia desdenhava e ria. E dizia:
“Para que tanto amor ao saber?”
Se quer saber, sei não, vai saber...
Eu não sei nada além de sentir, sei,
Se é que sinto, se é que sei que sinto.
Todo esse pensar me arrasta
E me afasta da graça de viver.
Por isso eu não penso, pressinto!
Sinto que sinto antes de sentir:
Imagino, invento, “desinvento”,
Reinvento, deixo de imaginar,
Imagino imaginar tudo de novo
(mas eu nunca minto...)
Eu suponho, tenho uma vaga idéia,
Eu acho que há muito mais ainda
Do que há entre o nascer e o morrer
Mas a filosofia, sisuda, fecha a cara,
E ainda dizia que era assim tão tola
Essa poesia que só fazia desdenhar
E rir dos mistérios todos e tão tolos
Que nós nunca pudemos desvendar.
A poesia ria pelo dia que amanhecia.
Quando entardecia a poesia ainda ria,
Porque não seria séria nem ao anoitecer,
A poesia nasceu do riso que escapa das coisas.
E ia mesmo parar de rir um dia,
Mas só mesmo depois de morrer...

Um dia morreu minha filosofia e morreu vã.
Nesse dia, eu me lembro, nasceu a poesia,
Que desdenhava e ria e ainda sempre dizia:
Se quer saber, um dia vamos todos morrer.
E enquanto não chega esse dia eu só sei nascer.
E nascer é a única poesia que eu sei ainda dizer...
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 05/04/2012
Reeditado em 11/05/2021
Código do texto: T3595736
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