E haverá de ser essa só mais uma
das tantas vezes que haverei de te perder.
Há de ser a saudade este silêncio,
essa dor lá não sei onde bem fundo,
há de ser o abraço da solidão tristonha
numa quietude de se fazer fim de mundo.
E eu hei de ter a paciência mais risonha
para cultivar esse sentimento vagabundo.
A vida que vai e se arrasta, se afasta, nefasta,
desgasta a força de juventude que nunca tive,
num que de sopro tal qual o sopro da morte
é aquilo de que se fará todo o esquecimento:
viver é se perder a esmo sem pertencimento.
E eu te perdi em todas as horas do dia,
te perdi quando não vi que nem bem amanhecia
quando eu esquecia do amor que amasse talvez
por sua vez um amor belo desses que talvez durasse.
E entardecia e a tarde a entardecer era tão serena,
que à boca pequena ninguém diria que se perdia
num anoitecer em que uma lua tão bela me distraía.
Eu ainda me iludia não mais pensar nunca mais em ti
mas nunca prometia que dizer era tudo o que me traía,
um não sei o que me subtraía o que nunca mais senti.
E eu te perdi em cada palavra,
arrancada às pressas de uns pobres pensamentos,
tal uns poucos versos de uns poemas inteiros,
que era toda a poesia que se fazia só para eu te perder,
a poesia que tanto me acalentava e me sustentava,
e me livrava até de um certo desamor num tal destemor
que era tudo ausência de qualquer medo de te perder;
E eu te perdi em cada momento
por entre os vãos do tempo
eu te perdi sem perceber
devagar como se envelhece
como se vive e se esquece
devagar como se padece
da pior dor que há por padecer
daquelas que se fingia que não sabia.
E subitamente aprendi de vez a te perder
De tanto essas noites virarem dia,
De tanto eu mastigar essa angústia
e enfeitar as madrugadas de agonia,
matar esperanças e colher desesperos
cuspir alegria e engolir a melancolia
De tantos desses dias caminharem para a noite
e a noite não garantir e nunca prometer o dia...