aviso de inutilidade pública

respeitosamente comunico ao leitor com nem tão profundo pesar

que perdi minha identidade -

desapareceu do meu eu sem deixar vestígio algum -

ao acordar numa opaca manhã outonal constatei o abandono:

a princípio dominado de transtorno repentino -

senti falta de algo -

sensação estranha se alojou na mente -

conturbação esquisita abateu meu corpo

estremeceu os ossos dos pés ao crânio -

o sangue arterial acelerou em desabalada carreira -

a pele crispou gélida nervosa estarrecida -

faltava algo sem eu saber que algo era -

aliás não raro se conhece com nitidez essa danada

porquanto quando muito é nos apresentada entre um vidro fosco

cujo lado oposto se enxerga pouco ou quase nada -

súbito - o teto veio abaixo de encontro ao chão -

escorreguei por um dos lados e corri apavorado

em busca de proteção -

diante do espelho eu via sucessão de imagens confusas refletia -

entretanto nenhuma tampouco já me servia -

as personagens que até então representei

desfeitas no acontecido deram as costas e fugiram em rebeldia -

resolvi procurar-me na música outrora amiga sincera companheira

não logrei amparo

pois a viola escarnecida negou aos arames ressonância sonora

fui pro quintal tentei desassossegar a velha coruja tranquila em descanso na balaustrada da varanda como de costume eu agia - desta feita deu de ombros -

desesperado retornei ao quarto - então compreendi a triste feliz realidade: minha identidade tinha-se escafedido!!

não havia nada a fazer senão o reinício -

consolou-me a hipótese de repensar conceitos severamente amalgamados no que se foi -

segui adiante por uma porta desconhecida -

desde então me refaço no refazer do dia a dia

Wagner de Oliveira
Enviado por Wagner de Oliveira em 23/03/2012
Código do texto: T3570436