SÁBADO ALADO

Por Carlos Sena

 
No sábado travo, no domingo finjo. Na segunda preguiça, na terça espicha. Na quarta ata, na quinta pinta. Sexta é inteira, sábado acaba o travo.
Amo e chamo no sábado e me dispo inteiro. Primeiro pela camisa de força que a vida nos põe e nos impõe usar; depois pela calça que ata o fruto proibido que na cama se revela -  tatear que pesca a tilápia da volúpia inteira. Depois a cueca que dificulta o voo do pássaro que se destina ao infinito das coxas mornas que a noite aquece...
O sonho da noite se relaxa no despir; no vestir das nossas mais fustigadas pegadas até a cama reclama e conosco parece gemer. Diabos soltos no sábado, presos em meu cinturão. Prende na cama a dona da louca ilusão que os ventos consentem em cumplicidade com o prazer.
O raiar do dia irradia. Pela cama sombra minha, sozinha, sai pela janela. Quando eu penso que sou eu, imaginem, pois era ela. Mas ela também não era, porque dela o perfume evaporou no mar Adriático quando estivemos além mar.
No sol do meio dia o sal do mar de Boa Viagem me convida mergulhar. Na volta do mar, o cheiro da maresia era todo o cheiro daquela noite na suposta companhia... Coisas do sábado alado... Vôo de ilusões paridas par-ti-das no afã de ser feliz.