"TRAJE NUPCIAL"
Quando a morte veste o seu traje nupcial e se aproxima; noiva bela, esfuziante e festiva, no seu longo vestido preto de cauda bordado a ouro e cetim, ela procura sorrateiramente a mão daquele rapaz; noivo pálido e enfraquecido, que tenta erguer pela última vez a sua cabeça ao sorrir. Agora possuído por uma expressão vazia de desejo e entrega, em que as mãos procuram avidamente a sua morte; gesto consentido e profundo na troca dos olhares, que se cruzam e consolam pela última vez, as bocas tocam-se e demoradamente beijamse com ardor e volúpia, deixando a sala envolvida numa luz brilhante e avermelhada de desejo. De repente, tudo fica escuro e desligado daquele mundo. Os noivos desaparecem sem deixar rasto. O silêncio e o vazio tomam conta de tudo. Não fosse aquele pequeno som quase impercetível, aquele momento seria a própria morte. Mas ao longe, devagar, muito devagar, cadenciando o som de uma fraca melodia, algo começa a ganhar corpo e contagia. São os sinos. Os pesados sinos da velha torre da igreja que soam graves e anunciam; o começo daquela tristeza. Para quem ali chorou, padeceu e ficou; o pronúncio de uma longa e pesada agonia.