Um dedo de prosa com Augusto dos Anjos

Ah, Augusto! Perfeita a tua dialética, lógico o teu pensar! Mas esqueceste de que a ingratidão, esse quinhão que recebemos ao longo de uma triste existência, se gloriou da minha mazela e trouxe consigo companhia para juntos festejarem o agonizar da minha última quimera. E qual pantera dos teus versos, os recebeu de braços abertos, para aplaudirem de perto o doloroso sepultar do bem que não me quis, do mal que me acompanhou até o último ato. De quando se apagaram as luzes da falsa glória de uma ribalta e sem aplausos e sem guarida, na utopia final, cerrei as negras cortinas do palco da minha ainda mais sombria vida. Quando mãos que julguei amigas, alçaram lenços brancos de fria e calma despedida e me lançaram ao abismo, ao precipício da indiferença, sem amor e sem ventura, sem ódio, sem crença! Esteve aqui presente para acompanhar o féretro do último idílio que me restou ,a senhora dona tristeza, que saltou de alegria sobre os restos mortais da minha fantasia. Na fria lápide por sobre o túmulo do meu sonho, a desesperança com mãos duras e frias solenemente o epitáfio escreveu: Aqui jazem teus anelos, teus anseios e tudo o que quiseste! O fracasso também veio com ares de vencedor e no velório do meu querer não chorou pela dor da minha alma! Veio também a mágoa, e atirou uma flor sobre o esquife onde repousava a esperança vã.... Ah, compareceu a desilusão para encher a minha taça, fazer um brinde à morte, e à sorte despediu! A inveja também veio vestida de bons amigos, dar os pêsames pela partida do bem eu que quis na vida. Fez-se presente a solidão, me aconchegou em seu peito e me fez companhia. O desencanto me enviou uma coroa de flores para enfeitar a campa onde enterrei amores findos.... A amargura dos meus dias, trouxe seu cálice de fel, fez-me sorver por inteiro a crueldade do meu destino . A traição se fez presente com seu beijo frio na gélida e pálida face da felicidade morta. A desventura apareceu e bailou com desenvoltura, na festa funesta do adeus dos meus sonhos.” Ficam aqui enterrados para sempre os teus desejos”, sentenciaram bocas, que um dia de beijos me cobriram ,balbuciaram lábios que escarraram sobre o cadáver frio de ilusões que se foram... E com pompa e circunstância, enterraram minha esperança em cova rasa, na terra miserável onde hoje apodrecem os ossos de alegrias que esperei, das venturas que morreram antes mesmo de nascerem, de bons presságios que outrora ansiei para o meu viver . Agora que todos tomaram seus lugares no palco dessa minha existência, no e escuro quarto das lembranças ,rola agora o meu pranto, escuta-se meus gemidos e meus lamentos. Pesa em meu ombros um fardo, fere-me a alma os espinhos, sangram-me os pés pedras que me lançaram falsos amigos ao longo desse triste, infindável e doloroso caminho. Aceito teu fósforo, amigo, acendo meu cigarro! E nas espirais de fumaça desenho vultos do escárnio. Sou fera e fera ferida, não pela terra, mas pelo hostil mundo, pela vida triste. A chaga, (essa em minha alma), nem aos vermes causa pena, nem mil jordões a curarão. As mãos de algozes de Estevâo, a mim apedrejaram, mas não se me abriram os céus. Aos que a minha boca beijaram, que não merecem sequer o meu escarro, mando também meus convidados ;Que lhes apresentem condolências pelo fim dos seus sonhos que um dia morrerão e seguirão em cortejo à sepultura dos desejos, onde estão agora os meus...Quanto à lama, essa já não me espera, pois repouso nela no poço obscuro do abissal inferno!