Devolução de abraços

Um dia um coco foi plantado, não sei a espécie, não sei o local. Sei que foi plantado. Cresceu um alto coqueiro que frutificou bastante, enchendo as panelas, os quitutes, eliminando sedes, servindo de abrigo, tantas coisas mais.

Mais antes de falar desse coqueiro, recordo-me que quando pequena, abraçava os pés de coco da casa onde moro, imenso quintal com areal e sombra, coqueiros altos a segurarem meu balanço. Após corridas intensas por entre os matos e o areal, ouvindo o barulho da corrente do rio, abraçava-me sorridente ao coqueiro que se balançava e parecia sorrir comigo, tremulando suas palhas e dividindo suas saúvas.

O ritual do abraço ao pé de coco perpetuou-se em mim, ficando todavia, escondido, silencioso, terno. Hoje desfaleço meus lábios em um pé de coco. Não na árvore, mas no que o homem fez do fruto dela. Eu imaginava o que se fazia com a quenga do coco. A carne do fruto eu via seu uso. Mas aquele material rígido, negro, áspero, perfeitamente moldado, o que se fazia dele? No meu tempo de infância, só o via sendo jogado fora e não compreendia como não se aproveitava aquilo. Percebi-o mais tarde, nos brinquedos, nas caqueiras das avencas, ao lado dos potes de águas dos ribeirões e cacimbas.

Hoje há um pé de coco me abraçando e solicitando meus beijos. Fizeram-no anel e o trago envolto em mim e nos meus sonhos. Um anel de quenga de coco.

Não áspero, liso. Rígido, mas delicado. Negro. Perfeitamente moldado para meu dedo. Vivo os dias da perpetuidade do abraço de um pé de coco, que já não me tem infante correndo e tombando sorridente em seu corpo, me tem mulher, cautelosa, que tem medo de avançar e abraçar. Mas, o pé de coco, sabe retribuir e me toma a cada dia e, consegue, a cada dia, ganhar um beijo de mim.

A cada dia, eu fecho os olhos, desmancho-me num breve sorriso, discreto, e beijo suave o meu anel de quenga de coco, que deixa de ser o que é e se dispõe a ser uma promessa de felicidade, pois só quem ama, sabe o valor intrínseco de um objeto desse tipo. E o retém.

Rosália Cristina
Enviado por Rosália Cristina em 14/02/2012
Reeditado em 18/02/2012
Código do texto: T3497768
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