POR QUE, UNDINE?
Tu eras livre e despreocupada, gentil Undine
Ninfa de radiosa beleza a mirar-se no espelho das águas
Dos rios, cascatas e lagos que são teu domínio
Cujo suave murmúrio se confunde com o teu cantar
Ou o inquietante silêncio traduz a tua mudez.
Tinhas o dom da imortalidade e serena tu sorrias
Penteando teus cabelos e vestindo-te com níveas espumas
Do líquido elemento que se agitava quando bailavas de alegria...
Mesmo imortal, diziam que eras incompleta e que alma não possuías
Já que faltava-te o amor de um homem e a bênção de um filho
Para que corpo e alma se reunissem e enfim te tornasses inteira!
Contemplavas os humanos enamorados e não compreendias
Tua antiga alegria tornou-se assim insuportável vazio
E então um jovem cavaleiro aproximou-se das bordas de teu reino
Às margens de um veio d’agua permitiste que ele te contemplasse
De modo que a paixão despertou no coração do nobre guerreiro
Que tomou-te por esposa, apartando-te da natureza que era teu lar!
Por que, Undine?
O cavaleiro jurou-te amor eterno e que cada hausto ou suspiro
Estando desperto ou adormecido, seriam teus, para sempre!
Irrisão! A ninfa se tornou mortal ao parir o filho do nobre guerreiro
E a beleza infinda de sua juventude intocada começou a fenecer
Como a rosa que murcha longe da terra e da água...
Suprema ingratidão! O coração humano é imprevisível e falho!
A esposa não mais atrai os olhos do cavaleiro, que cessa de buscá-la
Para encontrar em braços mais jovens o encanto que a abandonou.
A mágoa é mais insuportável que a solidão e deveis agir, Undine!
Quando teu marido não mais respeita o sagrado leito matrimonial
Entregue ao sono ao lado de uma jovem e linda criada
Tu lembras a promessa que lhe foi feita no tempo
Em que acreditavas que o amor havia lhe dado alma
Para viverdes em plenitude com aquele a quem entregaste tua vida!
“Pois agora cobro a promessa que fizestes, meu esposo!
Cada hausto ou suspiro que a mim empenhaste eu os retiro de ti,
Se adormeceres novamente o ar lhe faltará e morrerás
E quando em vigília respirar lhe será tão custoso
Quanto se embaixo d’água a sufocar estivesses!”
Assim Undine foi-se para sempre, para a profundeza das águas
Seu corpo pereceu, mas sua alma ferida agora tem uma pálida beleza
És jovem novamente, mas a que preço!
Nunca mais te mostraste a quem quer que seja
Apenas ouvimos sobre as águas um canto de tristeza!
Agora, não mais terei o atrevimento de perguntar:
Por que, Undine?
Inspirado na obra "Undine", de F. de la Motte Fouqué.