Desabe
O sol me mora nas estranhas e banha os sulcos cravados na pedra que me torno. Minhas próprias águas me correm e deixam sedimentos e a caverna, interna, eterna, da minha mente deixa seus passos marcados na areia úmida de um corpo que clama.
De repente, a besta que me habita rompe as teias tecidas e se mostra. Nua. Não era seu tempo. E se multiplica e faz a fusão. Rompe a dúvida, a incerteza. O gosto da impaciência sobe como uma bílis estranhamente doce em seu amargor. Desobedeço a mim mesma e me engano. Deixo de correr atrás do sentido e me recuso a ver. Tudo está sujeito a denúncias e rasgo a folha que tinha acabado de escrever naquele canto escuro do porão. Digo não à potencialidade desse teatro. O drama termina agora. E essa situação, esse surrealismo, o imposto, o controlado queima minha garganta. Essa procura de palavras iluminando as esquinas dos meus pensamentos me atordoa. Traição. A mão que me trai é a mesma que me afaga. E há uma hora repleta de escuridão e tenho medo. Mas há que se enfrentar os demônios. Eles levantam. Eu os tombo. Levantam. Eu os tombo. Alguém vencerá e não serei eu. Sou frágil e o carrasco implacável assola. Minha fúria está na sombra mas de nada vale. Um lobo suga minha seiva e a noite se apodera de mim com sua falsa inocência. Sou vencida. Caio profundamente no meu abismo. Meu precipício preferido de escondimento.
Enlouqueço e me torno sábia. Mutilo a exclamação da boca e asseguro minha paz no horizonte de uma madrugada de janeiro.