SOBRE O NADA
Enerva-me as flores secas da Primavera
E o frio insistente a me roçar o peito enquanto durmo
Nos meus nefastos sonhos em chuva mesclados
Salto como rusga de um passado de essência turva
Não são mais azuis as águas de Amaralina
Nem me enrubesce a face os carinhos roubados a caminho do nada
Troquei as traças pelo cheiro adormecido da naftalina
E, ainda assim, meu sossego se faz esparso
Sinto vontade de saltar do topo onde nunca estive
Mergulhar na escuridão dos rios de cobre da Chapada
E caçoar da minha falta de senso que costumava chamar amor
Escrevo sem linha que se trace
Sem nada que me faça trocar o tropeço pela areia movediça de logo mais
Não tenho mais tempo
Não tenho mais nada
Lembranças são fuxicos feitos ao lado da cigana velha
Enquanto adolesciam os meus sonhos infantis
Mal cuspi a vida e a vida já havia escarrado em mim.
E tem sido assim
Um descomeço
Um medo de ser sem ter sido nada que valha
Uma barba por fazer a me incomodar no meio da noite sem sabor
Feito gelatina estragada em meio a morangos apodrecidos
Estou mofando na geladeira antiga
E nenhum fruto me traz o gosto que imaginava haver em tudo o que tocava e, sem saber, virava veia sem sangue e pele sem viço.