Sempre achei que a beleza não tinha idade, mesmo antes de deixar de ser nova.
...Muitos anos atrás
Naquela viela alaranjada, o sol cismava encostar as tardes e deitar-se pelo chão de pedras antigas. Era outono no calendário que deixei de olhar sobre a mesa, quando fiquei perturbada pela visão daquele homem de beleza extraordinária. Sempre me incomodou a visão de homens demasiadamente bonitos. Nunca sei se são para ser olhados ou evitados, contemplados como merecem ou deixados em paz, porque me parece que aquele dom não é culpa que se carregue para a devassa alheia. Mas este homem parecia ter vindo junto com o sol daquela tarde, ser parte dele; ter saído de raios mágicos como aqueles que tingem nossos olhos e perfuram nossas almas. Isso foi mesmo assim, eu estava deslumbrada pela beleza dele e ele devia ter uns setenta e muitos anos... Talvez mesmo oitenta! Levantei-me no fim do café e, quando ia passar pela mesa dele, não resisti e, perguntei-lhe delicadamente se lhe podia dizer uma coisa. Ele fez que sim, com seus olhos de água, e eu lhe disse exatamente o que pensava: que ele era, talvez, o homem mais bonito que eu já havia visto. Ele sorriu, um sorriso lindo, mas triste, como se aquilo lhe causasse mais sofrimento do que alegria, pousou uma mão de dedos esguios a que eu tinha apoiado na mesa e disse-me: Ah não, minha jovem, a beleza está na juventude!
Uma frase cruel, sem apelo nem misericórdia, de cuja infalibilidade me tenho tentado convencer desde então.
Uma frase cruel, sem apelo nem misericórdia, de cuja infalibilidade me tenho tentado convencer desde então.