Corrida ao Rio Poty

Corrida ao Rio Poty

Como a maioria da infância das crianças nordestinas que moravam ou moram no interior, as minhas brincadeiras foram realizadas ao ar livre, não tinha muitos brinquedos e internet então? Nem se pensava na época. Adorava o lugar onde morava, falo aqui especificamente de Crateús, mas, devo deixar registrado que morei em um vilarejo chamado Poty do qual tenho boas recordações e claro em outros que não recordo ou recordo vagamente, pois era bem pequena quando passei por lá, meu pai trabalhava com vaqueiro e por tanto, quando não estava mais dando certo nas fazendas onde trabalhava nos mudávamos para outra, lembro-me vagamente do lugar que morávamos antes de chegar ao Poty, uma vaga lembrança é verdade, mas lembro, quando nos mudamos para Crateús já tinha a idade de sete anos e confesso que amei a experiência.

A natureza que era castigada pela seca, quando começava o inverno ficava tudo verde e brincava com os amigos no meio do capim que crescia, com meus irmãos também, Antônio e Francisco. Os amigos de Francisco meninos de idade de seis, sete anos, Lú e Naldo ambos irmãos, meu sobrinho Dino também de sete anos ou seis não recordo, eram os que mais estavam lá por casa.

E foi com os meninos Lú, Naldo, Paulinho um amiginho de Lú e Naido que naquela tarde estava junto, meu sobrinho Dino e meu irmão Francisco, que vivi uma aventura inesquecível entre muitas, como morávamos em fazenda, meu pai ou meus irmãos mais velhos (Neto e Deim) tinham sempre que ir buscar o gado em determinado local para colocar nos currais e naquele tarde meu pai não estava em casa, estava fazendo uma viagem para outro interior, os meus irmãos Neto e Deim que tinham ficado responsável de ir buscar o gado não tinham aparecido ainda e como já estava passando da hora (na minha opinião), de buscar o gado eu resolve que iria com os meninos buscar-los.

Comuniquei a decisão a eles e ficaram todos empolgados, queriam saber como nos iríamos, se em algum animal ou a pé, daí eu falei.

- Alguns vão de jumento e outro na égua preta comigo.

E assim, nos arrumamos pra ir, colocamos uma cangualha no jumento que papai tinha em casa, uma esteira na égua e fizemos a divisão de quem ia a onde, Lú, Dino e Francisco e o Paulinho amiginho de Lú foram no jumento, Naldo e eu fomos na égua, o cercado onde o gado ficava era um pouco distante e para nós era uma aventura, e foi mesmo tudo muito divertido, quando chegamos em casa não satisfeita com o passeio resolvi que tínhamos de ir ao rio para tomarmos banho e fomos.

O gado já estava no curral, já era quase noite, mas decidimos que voltaríamos logo, a animação era geral, quando chegamos ao local de entrada da porteira que nos levaria até o rio, um dos meninos desceu, abriu a porteira e eu juntamente com o Naldo na garupa da égua entramos primeiro, não sei se a égua se espantou ou se pelo fato de conhecer o caminho que levava ao rio ela começou a correr, como eu não tinha força de puxar o cabresto e fazer com que ela parasse, ela correu no sentido do rio eu e disse para o Naldo.

_ Segura para não cair. - E deixei-a correr livre, só pensava em segurar com força no cabresto e na crina dela para não cair, se caíssemos nos machucaríamos e ainda corríamos o risco de levar uma bronca dos nossos pais, sentia as mãos do Naldo agarradas em minha cintura e o vento batendo em meu rosto.

Perto do rio tinha uma olaria e naquele horário os oleiros estavam se preparando para voltar pra casa, muitos tijolos que tinham sido feitos naquela tarde estavam secando em um local aberto, como eu não podia controlar a égua ela passou por cima dos tijolos, os homens começaram a gritar comigo.

- Menino desgraçado, quebrou os tijolos!

Eu nem liguei e os gritos continuaram, eles pensavam que eram dois meninos montados, me confundiram com o meu irmão Antonio José, e quando chegamos a uma barreira que tinha no rio a égua parou de uma vez jogando nós dois lá dentro do rio, uma distância considera, lembro que afundei e fui quase no fundo rio, vale lembrar que era inverno e o rio estava cheio, nadei de volta e quando retornei a margem procurei logo pelo o Naldo e ele tornou também, estávamos se fôlego por te ficado debaixo da água e quando recuperamos o fôlego caímos na risada, só depois percebi que vários homens tomavam banho na margem do rio e que saíam procurando os locais perto do mato para poderem saírem de dentro da água, nadamos de volta pra margem e alguns dos homens que estavam lá na olaria chegaram brigando comigo, fiquei com medo, a minha sorte foi que o dono da olaria estava lá e chegou logo atrás deles e mandou que parassem de brigar comigo, e perguntou.

- Não estão vendo que é uma menina e não um menino? Por isso os outros estão saindo por de trás das moitas para que ela não os veja pelados.

Um deles falou.

- Uma menina que corre em uma égua daquele jeito?

-Sim. - Respondeu o dono da olaria que se chamava Cid, todos os homens saíram do rio e eu sair com o Naldo, o Cid estava muito preocupado com nós queria saber se tínhamos nos machucado e dissemos que não.

Quando saímos de dentro do rio foi que os outros meninos chegaram, é que às vezes jumento é um animal lento, os meninos alvoroçados queriam saber se tínhamos sentido medo, como foi cair no rio, e se íamos voltar montados na égua, foi uma alegria só, o Paulinho que era novato nas nossas brincadeiras estava radiante, disse que tinha sido muito legal ver a égua correndo e nós nos segurando pra não cair, não sabe ele que quase morremos de medo, o Cid fez mil e uma recomendações e claro proibiu o oleiros de brigar comigo. Os meninos não perderam muito tempo, pularam no rio e tomaram um delicioso banho.

Quando voltamos pra casa, devidamente montados na égua os oleiros me olharam com tanta raiva que fiquei arrepiada, disse baixinho para o Naldo.

- Se o Cid não estivesse aqui eles teriam me batido. - O Naldo só sorriu, foi uma aventura que comentamos por muito tempo, contamos e recontamos pra várias pessoas e hoje estou aqui escrevendo para que possa ficar registrada como lembrança de uma infância feliz.

Dedico essa história ao meu irmão Francisco, meu sobrinho Dino, ao ludinaldo (Lu), ao Paulinho maior divulgador dessa história na época, e especialmente ao Ronaldo (Naldo) assassinado no ano de 2000 numa briga estúpida. A todos vocês meu muito obrigada por terem contribuído para que eu tivesse uma infância inesquecível.

Jacinta Santos

01/09/2010

Jacinta Santos
Enviado por Jacinta Santos em 13/10/2011
Reeditado em 25/12/2011
Código do texto: T3274640
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.