A DEDICATÓRIA QUE NÃO FOI DEDICADA.

 

 

 

 

 

 

Isto não é um poema, era para ter sido, assim como foram tantos os que voaram para os olhos daquela mulher.

Em princípio era para ter sido um livro, pois até já estava com a brochura devidamente espiralada, pronto para ir para o prelo. (Como dizem os editores, uma boneca).

Mas, de súbito, mudou totalmente de rumo, tendo em vista o conselho de uma psicóloga, a minha filha.

E assim, resolvi afogá-lo no fundo do atracadouro do ferry-boat, e ali dormirá para sempre na escuridão das águas.

Ela a rigor, até merecia freqüentar as prateleiras de uma livraria, pois até então, ela tinha sido a única mulher que realmente fazia poesia em meu coração, e que, para espanto meu, eclipsou-se numa noite desesperada em busca de aventuras.

Este suposto livro, na época de sua gênese, foi batizado por ela de “Rosa Sideral”, mas infelizmente depois eu tive que rebatizá-lo de: “A dor da Perfídia”, e agora ele não é mais nada, pois já deve estar totalmente envolto por lamas e algas mortas.

Ela, em virtude da sua ineficiência congênita, preferiu trilhar outros caminhos que, talvez a leve silente para pélagos de sofrimentos e frustrações num infinito vazio abismal.

Felizmente, todo o amor envolvido nesse relacionamento, agora está representado num tesouro lindo que ela me presenteou. Falo da minha filha.

É uma jóia de menina que ainda faz transitar por mim, as suas melenas pretas de ébano luzidio, trazendo-me doídas saudades.

E quando estou com ela, simplesmente, me engravido de alegria.

Hoje, para encanto meu, estudamos francês à distância, e ela como uma linda morena gaulesa me diz: Je t’aime mon père – mon’amour – À tout à l’heure!

Nela, com o nome feito de um agrupamento de vogais e consoantes, pensava eu ter fundido com carinho e rara ternura um amor eterno.

Inútil foi o meu sonho, mas a minha filha preenche com todo o seu amor esse vazio existencial, e a ela eu transferi todo o meu amor que a mãe dela naufragou friamente.

De tanto tergiversar sobre o amor e a liberdade, dela mesma, se evolou uma negritude de sentimento que eu pensava não existir. Eis a razão da “DEDICATÓRIA QUE NÃO FOI DEDICADA”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



Eráclito Alírio da silveira
Enviado por Eráclito Alírio da silveira em 24/12/2006
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