ALMA VIAGEIRA

ALMA VIAGEIRA.

 

 

Na parcimônia primitiva de um velho carro de boi, parte a minha alma de forma lenta e chorosa, ainda impregnada pela envolvência do aroma de flores silvestres festivas e raros cachos tisnados de uvas velhas.

 

Ó mulher oca e fria!

 

Persiste na minha alma uma saudade tirana, escutando ao longe uma sensível melodia, na musicalidade de uma boneca loira de cabelos longos.

Ela se dobra em suaves rodopios sob os acordes de uma música triste, num ritmo de despedida.

Incomunicável e aprisionada num quarto vazio que não faz muito tempo, envolveu essa mesma alma em verdes cortinas.

 

Ó sentina de escombros!

 

Olfateio de forma inexplicável, um perfume de primavera quase azul, e que se evolava misticamente de um pequeno frasco distante, solitário e transparente que, na sua essência aspergida se fez singelamente “amour-amour”.

 

Ó magia e encantamento!

Ó quanto engano!

 

Vive essa mesma alma, obstinada e cheia de desesperança em meio às flores que, de forma teimosa, orbitam as fracas lembranças de um passado não muito longe do horizonte.

 

Ó mulher as flores eram para ti!

 

Esta alma está encerrada para sempre, num pequeno baú de madeira nobre, agrilhoada lá em seu interior, pelas algemas amarelas parecidas com o ouro puro.

Ali, foi sepultado no escuro incomunicável, um grito humano ressoando sozinho entre jóias, pratarias e anelantes sonhos.

 

Ó mulher quê mistérios tens?

 

Minha alma viageira persegue um itinerário confuso e desnorteado.

Ora, paira sobre a inocência de Clavson, ora se perde entre as montanhas e as rochas que se debruçam sobre o mar.

Ora, navega pelas praias de areias nômades, ora deseja o redirecionamento de um lembrado farol.

Desolado e triste, finalmente, cai na escuridão de um infinito abismal.

 

Ó abismo voraz! Ó mulher de mármore!

Alma viageira quem te fez viajar?

Alma viajante quem te fará parar?

 

Viaja alma viageira nas asas translúcidas dos poemas que, foram feitos de substância pura, assim como pura é a tua essência.

Vive alma viajante nos portos, nas praias e nas montanhas, vive o teu próprio farol de luminescência amarela e intermitente.

 

Ó mulher espanta-me a tua frieza!

 

Queira bem alma viajante. Amar é um bem que bem faz, a quem quer bem.

 

Ó mulher tu sabes querer bem?

 

Alma viajante amar é querer bem, que faz muito bem.

 

Ó mulher, um dia, tu amaste alguém?

 

Chora alma viajante, chorar faz bem!

Só chora quem bem quer.

As lágrimas alma viajante, verdadeiramente, são os cristais líquidos da tua própria natureza transcendental.

Alma viajante tu és rica e boa!

Viaja, viaja, quem sabe, as saudades lá no teu ermo serão menos doídas.

Mas não te esqueça minha alma viajante que, a tua alma gêmea chora também.

 

 

Ó mulher poço silvestre de ilusões!

 

 

 

 

 

 


Eráclito Alírio da silveira
Enviado por Eráclito Alírio da silveira em 23/12/2006
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