Acaba

Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar que tudo era pra sempre, sem saber que o “pra sempre” sempre acaba.

Legião Urbana

As lágrimas eram rios, eram cachoeira, eram mar. Transbordavam da jabuticaba, grudavam nos cílios e deles escorriam, lavavam a face pálida. A boca era triste e carregada, inchada, dolorida, contorcia-se ao choro. O cabelo era fio de cobre, desgrenhado e emaranhado, ainda assim sedoso e brilhante. Ela era toda dor e toda bela, a tristeza embelezava-a, as lágrimas irradiavam sua face com um brilho excêntrico. Não era beleza estipulada pela sociedade, era beleza real. Uma beldade que emanava seu poder mesmo em meio a rios de lágrimas. Na verdade, era como uma flor, e a água salgada que escorria de seus olhos como que a regavam.

A lua lhe iluminava, não só o corpo esbelto e a face fresca, mas a mente e o coração. Como que lhe dizia Acorde bela flor, rosa escarlate do amor. Não sofras mais, deixe que se abra seu botão e que exale o perfume que lhe pertence, deixe que contemplem sua beleza. E ela queria deixar florescer seu brilho, ela queria libertar-se, mas a dor era abismo e a sugava para o chão, para o chão, para o chão...

Queria voar! Era, antes de flor, passarinho. Um pássaro livre. Já havia voado, e como tinha saudades de estender as asas e sentir o vento sacudir as penas. Queria voar! Liberte-me redemoinho que me suga, deixe-me voar, deixe-me que liberte a mim. Mas a dor era muito grande, muito forte. Ela queria liberdade. Queria poder amar de novo – voar de novo. Queria ver-se livre de todo aquele caos de sentimentos e de sofrimentos. E sentia-se cada vez menor. Tudo era tão maior, e ela era apenas um pássaro com a asa quebrada.

O verde da árvore que estava sobre ela, como que lhe transmitia esperança. E o farfalhar das folhas ao vento parecia gritar-lhe Tudo acaba, tudo acaba! Nada é pra sempre. Eis a verdade. Como que para exemplificar-lhe, as folhas caiam, secavam, amarelavam, se uniam ao redemoinho e ao caos. Não se via mais lua, não se via mais esperança. Já não era mais flor, nem pássaro. Era apenas uma menina com olhos negros como a noite que chorava, chorava por um dia acreditar que era para sempre, quando, na verdade, até o “para sempre” é efêmero. Acaba. E, como tudo, a dor um dia também acabaria.

Jana Cicari
Enviado por Jana Cicari em 04/10/2011
Reeditado em 04/10/2011
Código do texto: T3257935
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