DE MANHÃ
A cada manhã esbarramos numa dúvida que nos acompanhará pelo
resto do dia. O toque do celular nos desperta, avisando que a mes-
ma realidade vai começar outra vez. Uma realidade que toma conta
dos instantes e faz com que acreditemos que a vida será sempre is-
so: uma paisagem afundada na indiferença e no medo das pessoas.
E a imaginação passa pelo paraíso duvidoso que distrai a realidade.
O pão sobre a mesa tem o mesmo gosto de ontem e, certamente,
terá o mesmo amanhã. As metamorfoses existem apenas nas meias
palavras que dizemos antes de enfrentar as lamas das ruas, a multi-
dão do metrô, as conversas banais que arranham nossos ouvidos. E
vamos juntando os cacos e colando tudo no espelho dos dias, rein-
ventando o sentido da solidão.