Barco embriagado ao mar.

Tudo girando ao meu redor na horizontal. Deixando fios, cordas, linhas e laços se partirem, darem nó, darem laço, engodarem. Os portos, as estações e os cais andam perdidos de tão embriagados. As pessoas desconhecem esse novo porto, as estações estão com os trilhos trocados e os cais já não são tão belos e úteis. Eles são feitos de passagens, suas entranhas são efêmeras. As vidas alheias se perderam quando passaram por eles.

Fiquem sabendo que não sou uma estação, uma praia ou uma qualquer cidade. Não sou um lugar público no centro da cidade, que já vira muita gente, percebeu muitas coincidências, desvendou muitos casos e acasos, registrou datas, testemunhou beijos, desafetos e outras histórias mais, tão populares e aleatórias. Tudo isso não dá qualquer importância aos que são de lá, muito menos aos que apenas estão de passagem.

Não! Eu quero ser aquela casa antiga de família, de pessoas, de cachorros, gatos, plantas e árvores. Casas com habitantes que não vão se perder de mim nos próximos 30 anos, que escutarei todos os segredos, que cercarei com paredes suas relações e eles não se deixarão por qualquer desavença. Paredes estas que rachariam só para mostrar que eles precisam cuidar de mim também. Vou acompanhá-los por muito tempo. Não, eu não gostaria nunca, pois seria sim uma casa velha e sentimental, daquelas que gostam do que se passou.

Às vezes o sentimento do mundo invade e é quase palpável. Gostar de casas antigas, de coisas antigas, de cartas, melancolias, livros velhos e suas marcas, músicas de outras décadas e de pessoas antigas do coração, sem falar das relações de antigamente, daquelas apaixonadas e amantes, em uma realidade ausente de computador ou até mesmo de telefone.

Não assisto jornais, não leio revistas e sou sempre a última a saber das notícias de tudo. Sou alienada e tenho um mundo paralelo, à parte. Sei às vezes o nome de tal escritor, como é seu estilo e qual é o seu contexto. Cogito a ideia de comunismo e posso também lembrar de tal vizinha que ninguém se fala mais.

Guardo coisas inúteis, e as coisas úteis, como a geladeira, apenas tenho. O meu fantástico tá no meu hoje, tá no sereno, é o sorriso do meu irmão, é a minha cadela que chegou hoje, é um elogio raro dos meus pais ou apenas um trago.

Ser aéreo, doida, talvez seja muito difícil. Talvez o nome disso tudo seja egocentrismo? Ao som de The Smiths e em uma página da internet qualquer, esvaiam as palavras.

Ak
Enviado por Ak em 21/08/2011
Reeditado em 09/12/2019
Código do texto: T3173675
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