Croniquinha sobre o espaço da serenidade
Noite após noite entrego o corpo à cama - não como ao amado, em certeza e alegria, mas a um amante, em outro tipo de certeza... ou feito bola em jogo com morte súbita: bola também precisa de descanso.
E o corpo já aceita uns extravios estéticos: a marca entre as sobrancelhas, as linhas de riso e choro, uma certa maciez no baixo ventre, os fios que mensalmente descascam a tinta - natural ou não... As pernas ainda podem com uma mini, mas evitam o uso - especialmente na varanda do segundo andar, por motivos óbvios; também podem dançar e dançar e dançar, mas evitam o uso com aquele sujeito - especialmente depois de três doses de vodka, por motivos não tão óbvios assim.
Os olhos, esses são ex-românticos misteriosos lagos escuros; oceanos outrora turbulentos e altos sob tempestade ou sérios e densos na calmaria, agora estão que nem riacho raso, calmo, com pedras para facilitar a travessia, e de onde um passante pode recolher água pura desde que entre com pés limpos.
Questionam-me: serenidade geralmente acompanha a maturidade, que tem relação com idade - com tempo, portanto!
Respondo que serenidade é um espaço de exercício de observação das coisas, inclusive do tempo: é uma escolha e uma construção.
De novo, sou meio incompreendida, e aceito. E espero.
Serenidade é isso, também.