Domingo Operário
“E chamou à luz dia, e às trevas noite;
E da tarde e da manhã se fez o dia”(Gen. I-5)
Cada gota demarcava pontualmente a trivialidade chuvosa dominical. O buteco pobre, inevitavelmente inebriado de operários encharcados, chupava o pensamento pelo sebo e pelas fendas das paredes negras, inibindo a própria alma. A TV distraía o desconforto dos bafos, marcados como o destino, atirando-se uns aos outros. O mijo, o calor do hálito, coletivamente ultrajante, depressões e a impressão nublada como o tempo. A Dona Amarga sorteava o corpo suado com uma dança insana de saia aluada. Até o desgraçado, babando o copo com uma gosma azeda, recebeu a Dona, penteando sua calva clara com as mãos confessas. Na rua, homens rijos, moralistas, atarefados do porvir, marchavam para os lares, denunciando o fim de mais uma dose de lirismo.