[Simpatia]
Ali, bem junto às escarpas rochosas da cachoeira,
a gameleira umbrosa,
com suas raízes atarracadas ao barranco,
matava a sede na rápida corredeira.
O curandeiro jurou:
disse que não era para eu duvidar,
para minha hérnia de nascença sarar,
era só fazer a simpatia!
Pôs o meu pé no tronco da gameleira,
demarcou o tamanho com dois riscos,
e fez um corte profundo na casca da árvore.
Escreveu meu nome num papelzinho
e rezou com a mão na minha cabeça.
Abriu com seus dedos a ferida que fizera no tronco,
colocou lá dentro o papel dobrado em três dobras.
Depois, juntou as abas da casca,
e amarrou o corte com sete voltas de uma embira.
Curado eu não fui,
mas pelo menos a sua parte a árvore fez:
generosa, recebeu o meu papelzinho,
e selou com sua seiva aquela ingênua promessa.
Lá, o papelzinho foi reintegrado à natureza,
mas aqui, em uma fenda qualquer de minha mente,
ficou guardadinho, do jeito que estava quando foi feito!
Eu não sabia... eram dois, os papeizinhos!
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Revisitando-me, às vezes, reencontro o mesmo espanto que antes me levara a escrever... às vezes, nada mais acho... só ingenuidade, só simplicidade; pois antes de mais nada, eu sou simples... quem é que não se deixa enganar pelas minhas palavras? Negaceio o que sou... sempre!
Ah... o poema é do Cap.2 -"Cria e Recria" - do meu livrinho, "Araguaris[Narrativas Poéticas]", com primorosas ilustrações de Paula Baggio... trabalho que apresentamos, em interarte, no Museu Nacional de Belas Artes - Rio, 2001