FILÓSOFO OU POETA?
(Ou qualquer coisa o quê?)


Pouco importa!
Estudei mais filosofia do que poesia. A poesia vem assim, mesmo sem eu pensar. Para filosofar eu raciocino, para poetar eu sangro. E para desenhar, nem uma coisa e nem outra, é mais estranho, uma outra forma completamente alheia de sangrar e raciocinar.
Mesmo assim não sou um artista, muito menos um desenhista, nem poeta tampouco. Seria filósofo, se quisesse, mas parece que não quero escolher as perguntas certas para as mesmas respostas erradas. Ou vice-versa, ou não, nenhuma delas. Nada disso.
Creio que o grande problema é a vida. A vida é e continua sendo o maior e pior dilema. Escolher viver é sempre essa escolha mais difícil.
E eu tenho que dizer as coisas sempre pela última vez. E depois mais uma vez e outra vez e depois ainda mais uma outra vez.
E cansa dizer...
As pessoas entram na minha vida para viver o melhor de suas vidas. Depois saem para viver o melhor de suas vidas e eu fico sempre com o pior de todas as vidas envolvidas, como coisa minha, só minha! Como agora fico e como ficarei pelo resto dos dias em que pisarei esta maldita terra em que a vida não vive o melhor dos seus dias.
Não se trata mais nem de encarar o “cara do espelho”. O espelho se quebrou e sobrou este cara aqui, sem reflexo, sem imagem ou imaginário, sem o relicário das ilusões que costumam enfeitar a hipocrisia dos nossos sonhos e desejos. Sem o que somos, este menos que pouco, um quase nada, para não dizer nada.
Agora é o real que bate de frente. O real despido de sua indumentária elegante que aliena e ofusca o olhar. Apenas o real vestido de sua mortalha que atormenta.
E vai ser assim de tudo ser fictício. O sorriso nas fotos, as paisagens e as mensagens, tudo o que vai escrito ou dito, a lembrança preponderante de nossos momentos “felizes”.
A vida é o grande dilema, o único. É essa merda que nem quero eterna. E vai ser única, sem qualquer outra chance, outra vida, uma outra realidade ou qualquer outro dilema. Não! Isso não existe e nem resiste a um olhar mais atento.
Tudo o que eu seria já não fui. E tudo o que serei ainda nem sei. E nem sei se vou saber se serei. Serei sempre este que é e não sabe, porque o que sabe é o que não é.
A arte, qualquer arte, é o melhor de minha pior parte. Ou o pior de minha melhor parte. E isto tanto faz como tanto fez.
Tudo o mais é só desperdício de palavras...
Se eu ainda escrever, é porque um resto muito pouco de razão haverá de pedir para eu sangrar todo dia um pouco. Mas não quero e não posso. E nem devo.
A poesia nunca me serviu de nada. O que sempre me serviu foi saber que vinha este vento violento. E fincar os meus pés no chão e sentir-me atravessado pela violência desse vento que vinha, que sempre houve por me trazer essa dor de ter de ser.
Por este motivo é que sempre estou desistindo de querer escrever e desistindo de desistir, sem dar por mim o que ou qual é o melhor.
É o momento de apagar os meus rastros, recolher os cacos e viver com os restos.
Eu sempre soube que chegaria o dia em que tudo haveria de calar. E não se vive impunemente com a plena consciência disso, porque dói.
A vida paira absurdamente entre o que poderia ter sido e o que realmente é. E eu sempre querendo viver o que ela nunca foi.
Nisso tudo, o amor é sempre um delírio dos outros que implica no nosso próprio delírio de acreditar. E eu não sou feito mais de coisas delirantes.
O amor, um dilema ainda maior do que o dilema da vida. Assim é. E não deve ser para quem quer realmente viver.
A vida com seus encontros e desencontros, com seus encantos e desencantos, um espelho que sempre se parte quando a gente pensa que vai ver o que realmente é. Porque não somos e nem fomos. Seremos e não sabemos. Seremos apenas o que perguntar.
Abro mão desse ofício, dispenso isso que seja um dom ou qualquer coisa que valha, que talvez tenham me dado e que eu não quero mais.
Eu não creio em nada. Melhor seria crer no inferno, que é o único lugar em que nada não “pode ser que”, porque é onde tudo realmente é. Lugar de choro e ranger de dentes, danação eterna, o lugar mais pleno de todas as ausências, desertos e distâncias. Portanto o lugar mais plausível possível. É o reino da razão, tudo mais é pura ilusão.
Escrevo isto certo de que viverei amanhã como nunca poderei viver mais.
E tudo que for mais do que isso, já vai ser demais...

 
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 20/06/2011
Reeditado em 19/05/2021
Código do texto: T3045690
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