[Dois Verbos do meu Outono]
Nos meus dias outonais, dois verbos tiram-me a paz: "haver" e "amar". O primeiro, por que junta-se, quase inconsutilmente, à palavra "última". Pior: junta-se no passado, assim: "houve aquela última vez em que...". E o segundo verbo... ah... é expressão da mais sublime, da máxima fruição da vida... mas também da perda maior, ou da perdição da vida!
Em tempos de folhas amarelecidas, ventos frios, céu cinza, juntos num mesmo pensamento, estes dois verbos me liquidam raso, raso... "Haver" carreia para o meu presente todas as lembranças da última vez, do último toque de mãos, do último gozo intenso, da última separação dos nossos corpos sedentos de... amar!
Ai... "haver" presentifica toda a amargura de tentar recapturar o instante, o cheiro, o sabor... Sim, não apenas o trágico sabor que "amar" me propiciou, mas também o calor daqueles últimos instantes que me deixaram partido, penando... penando, até o fim dos meus últimos dias, a condenação de jamais [te] esquecer, jamais...
Dois verbos do meu outono... por que esses!? É esta mente errante que faz essas conjuminações absurdas... palavras são apenas seres que demandam sua própria complexidade; sou pequeno, sou por demais ínfimo para deslindar os escuros das palavras.
[Penas do Desterro, 15 de junho de 2011]