DECLARAÇÃO DE SAUDADE

Caminho pelas ruas com tua presença incrustada na pele

É como se nunca tiveste ido embora

O arrastar das sandálias

O barulho da chave invadindo a porta

E aquele gosto de saudade

Mesmo quando o teu beijo era exato

Não consigo me desfazer da sua alma

Nem me libertar do teu cheiro

Ou da tua carne

Os cabelos finos que acaricio no vazio

Fazem dos meus dedos meros fantasmas iludidos

Isso me causa cansaço feroz

E, extenuada, me entrego ao sono forçado pelas pílulas

Mas não encontro alivio

Os meus sonhos te trazem para mais perto

Como se isso fosse possível

Caminho pelas ruas com o teu sorriso ecoando na mente

Não te vejo, não te vi mais, mas o amor parece moldado em sal

E fere as feridas que trago quase estancando o sangue das veias

Sinto tuas mãos enlaçadas nas minhas

Nossas pernas embaraçadas na cama

Nosso amor feito e refeito sem nunca querer parar

Tua companhia incorpórea transtorna a mente embotada de sol

É como se estivesses me esperando no bar da esquina

Como se fôssemos conversar por mais de 20 horas

Desafiando o tempo a passar

Caminho pelas ruas sozinha

Mas a minha solidão bate de ombros com tua imagem fugidia

Um nó engasga a garganta e as lágrimas deslizam suaves

Quase sem razão de ser

Se forem perceptíveis, pouco importa

O dia, sem você, é escuro

Há nuvens pesadas encobrindo lembranças

Mas uma fresta de sol me faz ver tua face

O teu sorriso está ali,

Calado ao pé do meu ouvindo

Prestes a gritar a alegria inexistente

Deixaste teu canto solo num canto do meu coração

E a tua música, com seus rifes, rompe o silêncio em mim

Caminho por todos os lugares,

Todos os dias

E, até mesmo em casa, tua voz murmura palavras que guardei

À margem da mágoa que provocaste

Temo te ver de fato

E me refugio para evitar que, ao acaso, o teu passo encontre o meu

Não teria palavras

Minha voz... Esquecestes de devolver

Também não te lembraste de levar teu coração para longe do meu

E se hoje nossos corações separados

Em mim batem juntos numa melodia insensata

É porque o amor negado

Não teve tempo ainda para ser esquecido

O amor descartado pela tua vontade

Continua em mim, fazendo-me refém desde sentir em vão

Queria tocar teus ombros largos

Cair sobre o teu corpo num mergulho de desejo e mar

Mar de Amaralina

Mar do Rio Vermelho

Mar da Bahia

Onde juraste me amar até o infinito,

Esquecendo de avisar que o infinito acaba...

Caminho, agora, por dentro de mim

E, nesta gruta ainda casta,

Encontro-te nas águas azuis e intocadas

Nestas águas me banho imaginando ser cada gota

Uma gota do teu suor

As gotas de suor que batizaste de pérolas

Não há nada que me afaste da sua presença

Nem mesmo a tua ausência de tantos anos

Porque nunca estiveste ausente em mim

Cravaste uma lança no meu peito

E não há quem possa retirá-la.

Isso somente tu poderias fazer sem me matar aos poucos

Como acontece agora quando mesmo

Sabendo-te longe, ainda que tão perto

Sinto tua alma escamada na pele do meu silêncio.

Iza Calbo
Enviado por Iza Calbo em 13/05/2011
Reeditado em 13/05/2011
Código do texto: T2967918
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