Horizonte perdido
À deriva em mar revolto de lembranças fragmentadas, singra o barco as águas desconhecidas de uma rota incerta. A calmaria de outrora, marcada pela existência de um horizonte ao alcance da vista, naufragou em denso nevoeiro que o tempo, insensível, incumbiu-se de formar.
Um vento gelado arrepia a superfície do mar, arrancando-lhe ondas descomunais, e o barco aderna. Contudo, aqueles fragmentos de memória lhe conferem alguma estabilidade, e ele resiste, seguindo em frente sob a forte cerração.
A tempestade não dá sinais de trégua, e o vento castiga com rajadas impiedosas, fazendo novamente o barco adernar, desta feita a ponto de quase mandá-lo para as profundezas das águas frias e indóceis. O mar se mostra faminto, sedento, como a querer tomar para si o que ainda resta de vida no convés da frágil nau errante.
Já não há mais céu para contemplar, ou estrelas-guias. Já não se vê mais o sol, tampouco o luar. Apenas o denso nevoeiro, as gélidas rajadas de vento e o mar revolto lhe fazem companhia. Mas o barco segue adiante, resistindo a todo custo, acreditando que aquele horizonte que um dia existiu permanece lá, à sua espera, em algum lugar mais adiante. Para ser, finalmente, seu porto seguro, depois que a tempestade passar...