TIJOLOS POÉTICOS, do ventre ao vento

DE VENTRE

resistir só com palavras e alma é meta. Escrever sem caneta é pintar sem pincéis, é partir sem ter pés, é cantar sem ter voz, é compor sem ter a dor da alegria, tecer a elegia subversiva, de dentro pra fora, como quem come intestinos e aflora ao sol.

AMORES

criar com o corpo, com vida, com idas e vindas, chegadas partidas e dores de amores e iras, mulheres filhos amigos intrigas, inquietude é o que anima o mundo, assim como expor vísceras perturba conturba deturpa a paz consentida, cutuca feridas sólidas.

CULPAS

há uma tranca na entrada principal, porta ancestral vetada e que separa, desmantela, é uma trama acadêmica o que há, um tipo de escola hermética, é o lacre da elite, esse medo acadêmico do suor, um silêncio que inocentaria todas as nossas poucas culpas

TEMPESTADE

me desculpem se me atrapalho na semântica, se não sou claro, se erro na sintaxe, é que algo me abre cicatrizes, derruba as torres plantadas do pensamento, implode diques e expõe meus guetos, é como uma tempestade negra ameaçando a cidade, apavoro.

LAVRAS

palavras são usadas para escamotear perigos, são como minas programadas pra degola futura, a palavra pode ser também só anúncio, artifício, farsa, cortina à frente, vento - aviso, pisca alerta seta, vire à direita, não dobre à esquerda, não se revolte, não olhe pra trás. Sal.

OFÍCIO

não pode ser a morte de ontem mandando no hoje, acho que nesse enredo não mais me encaixo, quando vejo a minha barba já cresceu sou outro hoje, na minha ferraria contorço ferro e palavras quentes e me queimo toda hora e não aprendo, é força do ofício.