O meu desejo mais profundo - o teu impossível retorno
Se eu pudesse, agora, bem agora, rasgaria teu rosto com minha ira infundada. Rasgaria teu desejo de ser bom e justo, tua fala suave e falsa, meu presente de vidro. Se eu pudesse agredí-lo, o faria sem dó, enviaria de bom-grado um mau-gosto, uma piada negra e infame, um antraz de tristeza.
Se eu pudesse te ver, bem agora, eu sentiria raiva e repulsa, nojo e medo. Se eu ouvisse tua voz talvez me tornasse um bicho pior do que já sou, mais selvagem, menos dócil, menos domesticável. Seria irascível, insana, demente. Esqueceria de tudo de bom e doce e desejaria a tua morte.
Repara que seria por apenas um segundo. No instante seguinte, meu olhar retornaria ao passado, revisitando a felicidade que outrora recebestes de mim, relembrando os beijos bem-dados, as mãos percorrendo os corpos hirtos de desejo e não de morte. Relembraria o adeus que me destes, tão lento e doído, e o adeus que te dei, convicto e cruel.
Em minha mente, neste segundo seguinte, habitaria uma paz imensurável. Meu desejo não mais gritaria, estaria satisfeito e bobo, refletindo a mim mesma. Eu me calaria, fecharia os olhos, abriria os braços, os abraços e o coração, e então meus seios desejariam o toque das tuas mãos, minha boca desejaria apenas o teu gosto, minha língua, um atrito. Meu corpo como um todo quereria o deleite impossível - não vê um amigo! - e eu ficaria novamente infeliz.