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Hoje não vou celebrar nada. Nem este sol bonito que me abraça,  nem o dia que já de manha se vislumbra maravilhoso. Nem o frescor desta brisa que sempre traz a esperança de volta, nas manhas de Abril. Porque hoje a esperança não é benvinda e porque hoje, todos os rostos estão fechados para os sorrisos e abertos apenas para o espanto, a incredulidade e a dor.

Hoje as estrelas que certamente estão escondidas aguardando a noite, não deverão aparecer, porque hoje é tempo de escuridão e não de luz. Nas paredes das almas há marcas de tiros e manchas de sangue dos inocentes mortos. Tudo muito recente. Ouve-se ainda, os gritos nos pátios vazios dos corações, de desespero dos anjinhos indefesos do realengo em seu martírio de morte.

Hoje a face que se vê, mesmo para quem pode manter os olhos fechados, é a face da brutalidade humana, sem disfarces, crua, nua e estarrecedoramente cruel.

Ela mostra que o balanço da humanidade ainda é negativo, absurdamente negativo. A monstruosidade perpetrada pelo assassino tresloucado é o pus do mundo, que purga em nossos olhos, sem piedade. O pior é que seu ato psicótico, não é totalmente alheio a nós, porque existe um pouco dele em cada uma das nossas cabeças.
Todos nós mantemos nossos leões em nossas jaulas, mas sabemos que, alteradas as condições de pressão e temperatura, o bicho pode sair com seu apetite sem controle. É o véu do mal da raça humana e seu equilíbrio precário. Os freios da educação, da civilidade, da educação, do equilíbrio mental, do temor a Deus não parecem mais suficientes. Agora só nos resta o aparato que os recursos da segurança humana e o dinheiro podem proporcionar para nos proteger.

Hoje vemos o quanto a ingenuidade que nos move através dos sonhos é ridícula. A realidade dança à nossa frente sem meias palavras e com gestos obscenos. Hoje vemos como os sentimentos do bem se esfarelam nos atritos da roda da vida e como são inúteis diante do mal.

Hoje no meio deste escuro todo, eu não vou acender uma vela sequer. Hoje eu penso apenas em chorar em algum canto onde não possa ser visto. Chorar, não pelos mortos, porque eles irão para o céu posto que, deve haver consenso de que eram parte de alguma constelação celeste perdidos no bairro do realengo. Mas, chorar pela minha condição humana e miserável e ter que partilhar destes horrores e aceitá-los como inevitáveis.  

Eu espero que quando as lágrimas despencarem( E elas sempre se movem sem controle ) que me ponham diante da vida de pé com a devida humildade, para entender o quanto preciso evoluir para ser mais próximo de um dos anjos mortos.
Os gritos do realengo nunca mais sairão de minha consciência nem da minha memória.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
               
Celio Govedice
Enviado por Celio Govedice em 08/04/2011
Reeditado em 19/01/2014
Código do texto: T2896604
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