PROVÍNCIA URBANA

O olho do poeta sobre a Cidade Baixa, no coração da capital dos gaúchos, é paixão topográfica localizada.

A vida corre. Humana, barulhenta, em meio aos pombos e volteios, asas sobre fios elétricos e árvores.

Durante o dia, trabalho, escola, azáfama de passos, sobrepassos. Só os pássaros bailam no espaço, furando a luz e a brisa.

À noite, regurgitam o chope, a cerveja, vinho e o uísque: o halterocopismo do lazer e da festa.

Até as flores das árvores antigas, dobradas, se vergam para escutar a música no som dos carros que trafegam como letárgicas tartarugas de borracha.

Um solitário gari, às três da manhã, cantarola uma canção tristonha, que se mistura ao rangido das rodas de seu carro de detritos.

No leito da rua morta, a também letárgica criatura abre a boca e vai largando longas baforadas de fumo e tédio.

O bocejo acorda a madrugada...

– Do livro EU MENINO GRANDE, 2006 / 2008.

http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/286699